O tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) sempre gera grande impacto em todo o país. No primeiro dia das provas do Enem 2023, realizado no domingo, 5 de novembro, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) anunciou o tópico do texto dissertativo exigido no exame: “Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”.
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua 2022, conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres dedicam, em média, 21,3 horas semanais às tarefas domésticas e ao cuidado de pessoas, enquanto os homens investem 11,7 horas nessa atividade. Além disso, a pesquisa aponta que as mulheres negras são as que mais realizam essas tarefas, com uma taxa de 92,7%, superando as mulheres pardas (91,9%) e brancas (90,5%).
Para especialistas, essa desigualdade de gênero e raça coloca um fardo excessivo sobre as mulheres, especialmente as negras, criando obstáculos para a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho e na participação em esferas públicas e sociais ainda predominantemente masculinas.
Laís Abramo, socióloga e secretária nacional de Cuidados e Família do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), lidera um grupo de trabalho (GT) para desenvolver a Política Nacional de Cuidados e enfatiza a importância do tema da redação do Enem. Ela destaca que a prova desempenha um papel crucial na democratização do acesso ao ensino superior e serve como um momento de reflexão sobre questões fundamentais.
Laís Abramo espera que o governo federal apresente propostas de um marco normativo em maio de 2024, reconhecendo o direito ao cuidado e os direitos daqueles que cuidam, bem como fortalecendo as políticas públicas existentes e criando novos direitos.
Ismália Afonso, jornalista e pesquisadora, oficial para os temas de gênero e raça do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) no Brasil, enfatiza a importância do tema da redação do Enem e observa que ele tem o poder de moldar o debate público. Ela argumenta que a invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pelas mulheres, não apenas no Brasil, reflete a desigualdade de gênero arraigada na sociedade e defende a necessidade de uma mudança cultural.
Além disso, a retomada de políticas sociais de igualdade de gênero no Brasil busca equiparar o país a outras nações latino-americanas que avançaram na mesma direção. A Argentina, por exemplo, reconheceu o cuidado materno como tempo de serviço para a concessão de aposentadoria.
No Brasil, medidas como a ampliação da licença-maternidade para mães fora do mercado de trabalho e a instituição de uma licença-paternidade mais abrangente estão em discussão. Além disso, metas educacionais, como a expansão do acesso à creche para 50% das crianças de 0 a 3 anos, estão em pauta, junto com a ampliação da escola em tempo integral.
Enfrentar esse desafio requer, segundo Ismália Afonso, uma abordagem ampla, incluindo a revisão das políticas públicas e um novo acordo social que reconheça a importância de redistribuir as responsabilidades de gênero e combater a desigualdade arraigada na sociedade.
Com informações de Agência Brasil.