domingo, 06 de outubro de 2024

Commotio cordis: entenda o raro tipo de parada cardíaca que quase matou jogador da NFL em campo

O desmaio ao vivo do jogador Damar Hamlin, de 24 anos, atleta de defesa da equipe do Buffalo Bills, da NFL (liga de futebol americano), chocou os espectadores nesta semana. O atleta sofreu uma parada cardíaca em campo após um choque com o jogador do time adversário, o Cincinnati Bengals.

Atualmente, Hamlin está se recuperando no Centro Médico da Universidade de Cincinnati, em Ohio.

Na manhã de hoje o Buffalo Bills tuitou que a função cerebral do jogador parece não ter sido comprometida

“Damar mostrou uma melhora notável nas últimas 24 horas. Embora ainda gravemente doente, ele demonstrou que parece estar neurologicamente intacto”, escreveu o time na rede social.

De acordo com o cardiologista Roberto Yano, especialista em marca-passo, a parada cardíaca, de forma geral, é uma emergência grave, que pode levar o paciente a óbito em poucos minutos.

“Quando o coração para de bombear, a circulação sanguínea fica incapaz de levar oxigênio a partes vitais do nosso corpo, como o cérebro, por exemplo. Quando não é revertida em tempo hábil, a parada cardíaca pode levar a sequelas graves e à morte”, explica Yano.

No caso de Hamlin, pode ter ocorrido um “evento raro” conhecido como commotio cordis (expressão em latim para “agito no coração”). Essa classificação se dá devido às condições extremamente exclusivas para que esse tipo de mal súbito aconteça.

“O atleta teve uma pancada forte na região do tórax, em um período específico da repolarização ventricular cardíaca, o que pode ter gerado uma arritmia maligna, que chamamos de taquicardia ventricular, e que rapidamente se degenerou para fibrilação ventricular, que é um ritmo de parada cardíaca”, diz o cardiologista.

Isso significa que a pancada, que aconteceu na região do precórdio (acima do estômago ou do coração), em um momento exato do ciclo cardíaco (início do pico da onda T), provocou uma desorganização elétrica no coração. Com esse desajuste, a atividade elétrica se degenerou, iniciou um quadro de arritmia maligna e, posteriormente, a parada cardiorrespiratória.

Essa situação exige um atendimento imediato e com o uso de desfibrilador o mais rápido possível, para reverter o ritmo cardíaco. De acordo com Yano, “cinco minutos de parada cardíaca já podem causar lesões cerebrais irreversíveis”.

“Cada minuto é crucial. Após quatro minutos de parada, as chances de sobrevivência já diminuem muito, e o risco de sequelas permanentes aumenta exponencialmente”, acrescenta.

A condição, apesar de rara, é mais comum em atletas jovens, do sexo masculino e menores de 16 anos, segundo o especialista.

“Nessa fase a caixa torácica ainda está em desenvolvimento. No caso do atleta jovem [Damar], [foi] devido ao alto impacto sofrido em local específico e no momento exato do batimento cardíaco”, complementa Yano.

Não apenas a idade, mas a prática de esportes de contato, como o futebol americano — praticado por Hamlin — aumentam o risco de o atleta sofrer esse tipo de mal súbito.

“Esportistas de contato, como lutadores de artes marciais, jogadores de beisebol, de hóquei, são os mais afetados por essa entidade, justamente pela maior possibilidade de sofrer traumas torácicos durante suas competições esportivas”, alerta o cardiologista.

Por se tratar de um evento raríssimo, não existe uma prevenção para a condição. O ideal é usar de forma correta os equipamentos de proteção e manter uma boa capacitação dos profissionais de saúde da equipe.

“Acredito que o mais importante nessa situação é ter fácil acesso um DEA [desfibrilador externo automático] para a rápida reversão dessa arritmia maligna quando necessário. No Brasil, vemos em poucos locais o DEA, e muito menos ainda pessoas que saibam utilizá-lo da forma correta”, adverte Yano.

Hamlin deve seguir o tratamento mais comum, que é permanecer sob cuidados médicos para identificar se houve dano ao coração, como arritmia, e continuar a receber cuidados cardiológicos e pulmonares.

A última atualização do Buffalo Bills, no Twitter, diz que o atleta “permanece na UTI em estado crítico com sinais de melhora”.

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