segunda-feira, 17 de março de 2025

A música que nos rodeia

O dia é 29 de agosto de 1952 e você foi convidado a assistir a primeira apresentação de 4’33”, peça para piano escrita por John Cage. Ao chegar ao Maverick Concert Hall, em Woodstock, estado de Nova York, você busca seu assento e espera pelo início do espetáculo. O pianista entra e o que você admira é a cena abaixo.

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Muitos acharam uma piada de mau gosto. Outros devem ter pensado: “então o sujeito se matricula em uma escola de música, dedica sua vida ao seu instrumento para ficar parado na frente do piano por quase cinco minutos!?” “Desde quando isso é música?”, pensaram outros. É claro que houve os que ficaram fascinados com a composição inovadora de Cage.

A recepção de 4’ 33” tampouco foi unânime. Enquanto alguns consideraram a música uma provocação sem sentido, outros receberam-na como uma obra revolucionária pois questionava os fundamentos da música ocidental. Seja qual for a reação de quem assistir essa obra hoje, o silêncio de 4’ 33” se tornou uma das músicas mais influentes e estudadas do século XX.

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Apesar de muitos pensarem que a obra de John Cage era sobre o silêncio, o autor tinha uma opinião diferente. Ele afirmava que “4’33” era uma atenção ao som, e não um som em si mesmo”, e que por isso não deveria ser julgado pela sua ausência de som. O som a que se refere Cage, não é o som de um instrumento, mas os ruídos que ocorrem durante um concerto e para os quais ninguém dá atenção.

Em algumas ocasiões, ele chegou a afirmar que a reação do público e da crítica era parte da obra e que sua intenção era criar uma experiência para o público. Para Cage 4’ 33” era um desafio às expectativas do público e da crítica sobre o que a música devia ser e como devia ser ouvida. Sua ideia era que os espectadores participassem da criação da música por meio de sua própria atenção aos sons.

No vídeo abaixo podemos ouvir o que o próprio John Cage pensava sobre a ideia de música.

Em 4’33”, Cage questionou a ideia de que a música se restringe a uma partitura ou a uma performance particular. Para o compositor a música está em toda parte e a tarefa do músico é abrir nossos ouvidos e nos tornar conscientes dos sons ao nosso redor.

Dentro desse mesmo espírito Murray Schafer, canadense e amigo de John Cage, desenvolve o conceito de paisagem sonora.

Tanto Schafer quanto Cage acreditavam que os sons do ambiente eram uma forma legítima de arte e que poderiam transformar a maneira como ouvimos e entendemos a música e o som. 4’33” é um exemplo disso, pois, por meio dela, o público é encorajado a ouvir os sons ambientes presentes no local da apresentação. Isso inclui ruídos do público, a tosse, a respiração dos músicos e sons externos.

Muitos podem pensar que esse tipo de abordagem à música significa o fim da criação musical ou transformaria o compositor em um mero observador dos sons presentes nos ambientes em que estamos. No entanto, esse conceito de música levou Schaffer a criar músicas como a que podemos ouvir no vídeo abaixo.

Muitos, no entanto, podem achar esse tipo de música muito difícil de se ouvir, pouco interessante para pessoas comum, mas se pararmos para pensar a paisagem sonora já fez parte de canções populares muito conhecidas. Quem não se lembra dos pneus cantando no início de “Por isso corro demais” de Roberto Carlos ou dos sons de ondas e de motores em “Yellow submarine” dos Beatles?  Há também os sons de relógio e moedas que escutamos em “Time” e “Money” do Pink Floyd.

Se vasculharmos o baú de nossas memórias musicais nos lembraremos, com certeza de outros exemplos em que o material musical vai além das nossas queridas sete notas musicais.

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Ulisses Mantovani
Ulisses Mantovani
Bacharel em Música da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e Servidor Público Estadual

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