sábado, 2 de novembro de 2024

Projeto da Fiocruz eleva cobertura vacinal na PB e no AP

Em menos de um ano, a cidade de Cuité de Mamanguape, a 64 km de João Pessoa (PB), quase dobrou a cobertura global de vacinas de rotina de suas crianças: saiu de 32%, em 2021, para 59% no início deste mês. Para alguns imunizantes, mais do que triplicou. A cobertura da pentavalente passou de 31% para 106%, a contra a paralisia infantil de 26% para 104%, e a tríplice viral, de 33% para 91%.

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A Paraíba também foi o primeiro estado da federação a alcançar, em outubro último, a meta da campanha de vacinação contra a poliomielite, que é uma cobertura de 95%. O Amapá foi o segundo a atingir esse objetivo. No país como um todo, a taxa ficou abaixo de 60%.

Os dados desses dois estados são resultados de um projeto inédito que busca resgatar as altas coberturas vacinais realizado pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) em parceria com o Ministério da Saúde e a SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).

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Após um diagnóstico das barreiras que enfrentam para cumprir metas de vacinação infantil, os municípios fizeram planos de ação e adotaram medidas como vacinação em creches, contratação e capacitação de profissionais para a imunização e reforço da comunicação com a comunidade no enfrentamento da hesitação vacinal e das fake news.

Lançado em dezembro de 2021, o projeto foi desenvolvido em 25 municípios da Paraíba e em 16 do Amapá. A iniciativa deu tão certo que, neste ano, o governo paraibano decidiu entendê-la a todos os 223 municípios do estado.

Os dados globais do projeto ainda estão sendo contabilizados e deve servir de modelo para uma série de mudanças na área da vacinação que a nova ministra da Saúde, Nísia Trindade Lima, deve anunciar nos próximos dias.

O PNI (Programa Nacional de Imunizações), por exemplo, deverá se transformar em um departamento dentro da estrutura do ministério. Em 2021, a vacinação infantil no país chegou a seu pior nível em três décadas, com 68% de cobertura contra 97%, em 2015. Com isso, houve a reintrodução do sarampo e há a ameaça de doenças já erradicadas, como a poliomielite, voltarem a fazer vítimas no país.

“A vacinação deixou de ser prioridade há muito tempo. Não há investimento, não há capacitação dos profissionais, muitas das pessoas que estão nas salas de vacinas não são contratadas, mudam a todo o momento, o que aumenta o risco de erros, de aplicação de vacinas erradas”, diz a pediatra Isabella Ballalai, vice-presidente da SBIm.

Para ela, o projeto mostra que as altas coberturas só serão retomadas se a vacinação estiver entre as prioridades dos gestores municipais. “A gente vê investimentos do Ministério da Saúde destinados à vacinação sendo usados pelos municípios em outras áreas da saúde.”

Além da parcerias com os gestores estaduais e municipais, o projeto conta com o apoio de vários atores, como universidades, escolas, igrejas, sindicatos, o MST (Movimento dos Sem Terra) e o Grupo Mulheres do Brasil.

Segundo a médica Maria de Lourdes de Sousa Maia, uma das coordenadora do projeto na Fiocruz, nos últimos anos houve um enorme distanciamento entre o PNI e a atenção primária à saúde, que executa as ações de vacinação nos municípios. “Isso gerou um desânimo muito grande na ponta do sistema.”

Os pesquisadores envolvidos no projeto detectaram vários problemas que atravancam as ações de imunização como a falta de computadores nas unidades de saúde e de carros para fazer busca ativa dos não vacinados, além da ausência de profissionais da enfermagem fixos nas salas de vacinação.

Maia afirma que também encontrou salas de vacina com horários reduzidos, o que dificulta o acesso. “Se o horário da vacina é das 8h às 17h, não dá para encerrar às 11h e mandar a pessoa voltar em outra hora. Muitas vezes, é na hora do almoço que alguém pode levar o filho para vacinar.”

Para Talita Alves de Almeida, gerente-executiva de Vigilância em Saúde da Paraíba, a sobrecarga dos profissionais da atenção primária também dificulta as ações de vacinação. Por exemplo: os técnicos de enfermagem que atuam na vacinação monitoram também os hipertensos, os diabéticos, fazem curativos e atendimentos domiciliares. As enfermeiras, que devem supervisionar a sala de vacina, fazem pré-natal, colhem exames citológicos, fazem teste de HIV entre outros.

“O profissional está lá na unidade, a unidade está aberta, mas ele está disponível naquele momento em que a mãe está esperando para vacinar o filho? A gente precisa rediscutir o papel desse profissional da enfermagem na sala de vacina”, diz.

Ela afirma que durante a campanha de vacinação contra a poliomielite, entre agosto e outubro, houve um monitoramento e uma comunicação diária com os profissionais e agentes de saúde para que os municípios atingissem as metas. “A gente ligava e dizia: você está com 70% de cobertura, suas crianças com menor cobertura são as de um ano. Onde estão elas? Na creche? Você já fez a vacina na creche?”

O diálogo com a população sobre a importância da vacinação aconteceu em vários espaços, como nas igrejas e nas escolas, e as unidades de saúde passaram a abrir aos sábados.

Com isso, dos 223 municípios do estado, só oito não alcançaram metas acima de 95% na vacinação contra a pólio, mas chegaram bem perto. E apenas um ficou com 83%. “Tivemos municípios que entre agosto e setembro saíram de 30% de cobertura e bateram em 95%”, conta Talita Almeida.

Há ainda dificuldades dos profissionais em lidar com os sistemas de informação. “Encontrei pilhas de papéis, com dados para serem digitados. Não adianta só fazer ‘lives’ com tutoriais sobre os sistemas. Tem que botar o pessoal numa sala com computador e treinar presencialmente”, diz Maia, da Fiocruz.

Também existem problemas na entrada dos dados dos municípios no sistema de informações do Ministério da Saúde. Em outubro, a estimativa era que havia uma defasagem de 30 milhões de doses entre as vacinas efetivamente aplicadas e as taxas que aparecem no Datasus.

Maia afirma que a equipe do projeto não encontrou falta de vacina em nenhum município. “Em muitos, as câmaras frias estavam muito cheias. Mas isso não costuma ser um bom indicador. Quer dizer que as vacinas não estão sendo aplicadas.”

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