Docentes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, ligada à Universidade de São Paulo (USP), saíram em defesa do retorno da deputada estadual Janaína Paschoal (PRTB) às salas de aula da instituição, onde leciona direito penal.
Nesta segunda-feira, 6, o Centro Acadêmico XI de Agosto, representação política dos estudantes, divulgou um abaixo-assinado contra a volta da parlamentar, alegando que ela “não é mais bem-vinda” após ter tido uma “contribuição indecente para o País” nos últimos anos.
O diretor e a vice-diretora da faculdade, Celso Campilongo e Ana Elisa Liberatore Bechara, emitiram uma nota em que lembram os direitos de “livre manifestação do pensamento e a liberdade de consciência” garantidos pela Constituição de 1988, que se aplicam também às diretrizes das atividades intelectuais e científicas: “É na trilha dos mandamentos constitucionais que garantem a liberdade de cátedra e a livre manifestação do pensamento de todos os seus docentes que a Faculdade reafirma seu compromisso continuado e inabalável com a construção da democracia e o crescente respeito às diferenças”.
Em artigo publicado em um site jurídico, o ex-diretor da São Francisco Floriano de Azevedo Marques Neto, que afirma ter ideias “absolutamente opostas” às de Janaína Paschoal, defendeu que o desejo de proibir o retorno da parlamentar às salas de aula é um “desrespeito à história de pluralidade” da instituição.
“Querer proibir que um professor reassuma sua docência, especialmente pelo fato deste docente professar ideias com as quais discordamos, para além de ferir as liberdades constitucionais, é um desrespeito à história de pluralidade que marca o Largo de São Francisco.
Janaína Paschoal pode representar tudo com que discordo, mas é professora e, portanto, deve ser tratada com respeito e com a tradição plural das Arcadas”, escreveu.
Marques Neto também lembrou que a deputada estadual é concursada, portanto, deve retornar ao posto assim que sua licença acabar. “Terminada sua licença para exercer mandato de deputada, tem o direito e o dever de retomar suas atividades”, disse.
Ao Estadão, Janaína Paschoal afirmou que o seu mandato será concluído no dia 14 de março e que já informou ao departamento que está disponível para retomar suas aulas a partir do dia 15.
A opinião de Marques Neto foi endossada pelos departamentos de Direito do Estado (DES) e Filosofia e Teoria Geral do Direito (DFD). Em nota, as instituições defenderam o histórico do Faculdade de Direito do Largo de São Francisco de defesa e respeito ao pluralismo, à diversidade, à Liberdade de Cátedra e de opinião.
O texto de Marques Neto foi respondido pelos representantes do Centro Acadêmico XI de Agosto. O grupo afirmou que o ex-diretor erra ao defender a parlamentar e argumentam que a instituição não é plural: “A Faculdade de Direito da USP, portanto, não é marcada pela pluralidade, mas sim pela exclusão, a começar pelo perfil histórico do seu corpo discente e docente, que foi por séculos e continua composto por uma classe social com conta bancária e cor de pele definidas”.
Segundo o Centro Acadêmico XI de Agosto, o direito de retomar as atividades docentes é evidente, mas não a priva de receber críticas quanto a sua atuação pública. “Todavia, isso não a torna imune do questionamento legítimo por parte dos estudantes sobre os seus atos políticos.
A responsabilização sobre aquilo que os professores dizem e fazem deve ocorrer, seja nas instâncias internas da universidade ou no debate político”, afirma a entidade, em nota. “A Faculdade não está a serviço da sua carreira, ela é quem deve estar a serviço da universidade.”
A resposta do grupo político estudantil ainda defende a necessidade de “ser intolerante com os intolerantes”: “O falso vitimismo da extrema-direita deve ser desmascarado e os seus representantes julgados politicamente e juridicamente.
Tanto os seus líderes absolutistas quanto aqueles representantes esclarecidos, como é o caso de Janaína Paschoal”.
‘Responsabilidade’
Ao Estadão, Janaína Paschoal afirmou que a manifestação dos colegas docentes é sinal de “responsabilidade para com a história da faculdade e para com os deveres dos educadores”. Ela reforçou que não teme ser impedida de retornar à cátedra e que não há embasamento legal para destituí-la do cargo de professora.
A deputada estadual se tornou alvo dos estudantes por sua trajetória política, que ganhou destaque a partir da abertura do processo de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff. Janaína Paschoal assinou a peça jurídica que serviu de base para o impedimento da petista ao lado de Miguel Reale Júnior.
Mais tarde, chegou a ser cogitada para ser candidata a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro, em 2018, mas preferiu se candidatar a uma vaga na Assembleia Legislativa de São Paulo. Então filiada ao PSL, ela se tornou a deputada estadual mais votada do País.