“Eu era uma senhora feliz, hoje me sinto mutilada. Não farei a reconstrução de mama”. Maria Cecília, diagnosticada com o câncer de mama aos 69 anos, relata o trajeto percorrido na luta para vencer a doença. Cecília faz parte da estimativa feita pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca), onde a taxa é de 32 casos em cada 100 mil mulheres no Espírito Santo.
Por isso, o mês de outubro realiza mobilização para conscientizar a população sobre a importância do diagnóstico precoce visando a redução dos casos e da mortalidade pela doença.
“Eu descobri o câncer de mama em uma consulta de rotina. Fui encaminhada para realizar o exame e com dois dias o hospital entrou em contato para que eu fosse até o local. Naquele dia recebi a notícia que minha luta contra o câncer estava apenas começando”, recorda.
O mês evidencia a necessidade de realizar o exame para diagnóstico, pois foi dessa forma que Maria descobriu que iria precisar de cuidados. Os exames podem prevenir a descoberta tardia e riscos maiores.
Retirada da mama
A caminhada de Maria em combate ao câncer passou por muitos desafios. Apesar de estar sendo realizado o tratamento, foi preciso a remoção da mama, além de ter passado também pela perda do cabelo.
“Não farei a reconstrução de mama, estou utilizando uma prótese doada pelo hospital. É muito sofrimento, já realizei muitas cirurgias”, conta ela.
A pressão estética da sociedade faz com que as mulheres que passam pela perda do cabelo, devido à quimioterapia, tenham sua autoestima corrompida.
“A parte que mais me abalou foi a perda do cabelo. Até mesmo nos dias de hoje, apesar de ter crescido novamente, isso me afeta. Tinham me avisado que ele cairia, mas quando eu vi saindo em minhas mãos, confesso que foi um dos momentos mais tristes que já passei”, relata.
Fio de Luz
Visando a recuperação da autoestima de pessoas na luta contra o câncer, a organização sem fins lucrativos Fio de Luz, se mobiliza em prol da causa. Produção de perucas em massa são feitas e entregues às mulheres em recuperação.
Com mais de 10 mil perucas doadas, em cinco anos, a ONG está localizada em diversos estados brasileiros, incluindo o Espírito Santo. Também sendo representada nos Estados Unidos, a organização faz um trabalho árduo durante todo o ano.
Para doar
Uma das pessoas que contribuíram para o trabalho da entidade foi Maria Luísa, de 19 anos, ela fez sua doação à ONG Fio de Luz, motivada por sua avó paterna, que faleceu devido ao câncer.
“Eu sempre incentivo as pessoas a fazerem qualquer tipo de doação, principalmente de cabelos, sangue e medula. Doar é muito importante para a sociedade, porque mais do que fazer bem para quem doa, é uma forma simples de ajudar outras pessoas. É um impacto real e muito positivo”, explica Maria Luísa.
SUS no combate ao câncer
O Sistema Único de Saúde (SUS) é considerado um dos mais complexos sistemas da saúde pública. O serviço busca abranger desde os mais simples atendimentos, até mesmo os minuciosos transplantes de órgãos.
Neste mês voltado a conscientização, o sistema disponibiliza, por meio de secretarias, diversos programas e atendimentos. Unidades de saúde dos municípios realizaram palestras, foram até escolas, levaram os exames mais perto das mulheres e democratizaram o acesso à prevenção e cuidados à saúde.
Atualmente, o Governo Federal apresenta ações de prevenção e controle do câncer de mama em todo Brasil. O Ministério da Saúde anunciou a ampliação do acesso à cirurgia de reconstrução mamária em mulheres com diagnóstico de câncer de mama que foram submetidas a mastectomia pelo SUS. Os hospitais serão habilitados e classificados de acordo com o desempenho. Dessa forma, os serviços de saúde que alcançarem uma melhora significativa, receberão mais recursos financeiros para ampliação do acesso. O impacto orçamentário previsto é de R$100 milhões.
Combater fatores de risco é essencial para a prevenção. Por exemplo, o sedentarismo, a obesidade, o consumo de bebida alcoólica e o sobrepeso após a menopausa. Segundo o INCA, entre 5% e 10% dos casos estão relacionados com causas hereditárias ou genéticas.
Força e perseverança
Assim como Maria Cecília, Lúbia Costa, de 46 anos, também recebeu o diagnóstico do câncer de mama. Há menos de um ano, sua rotina precisou ser completamente modificada e por conta disso ela passou a enxergar a vida com outros olhos.
Ainda há barreiras para enfrentar tal processo, mas Lúbia não se deu por vencida e revelou como fez para seguir com os tratamentos de cabeça erguida.
“Precisei raspar meu cabelo, mas logo em seguida me acostumei. As pessoas ao meu redor contribuíram para que eu pudesse superar aquele momento. Recebi muitos elogios e passei a usar lenços, o que ajudou muito na minha autoestima”, declarou.
Apoio e prevenção
A Associação Feminina de Educação e Combate ao Câncer (Afecc), em 2022, deu para o mês de conscientização o tema “Amor que cuida”, com objetivo de ressaltar os laços que existem na vida dessas mulheres. Com início em abril de 1952, a associação vem sendo referência na sociedade em combate à doença.
Radioterapia, quimioterapia, cirurgia, entre outros projetos e assistências são oferecidos pela associação. Bianca Beraldi, assistente social da Afecc, explica como é o trabalho direcionado para a comunidade.
“Trabalhamos em inúmeros projetos sociais. Entre eles, o programa de assistência integrada, o fornecimento de medicação, suplementos nutricionais, cesta básica e próteses de mama. Além de cursos, também existe uma infinidade de itens visando o melhor do paciente”, disse Bianca.
Maria Cecília e Lúbia Costa receberam ajuda através da associação, atualmente ambas participam de projetos oferecidos, o que segundo elas, contribui para a saúde física e mental.
“Eles foram essenciais para mim, não reclamarei de nada. Hoje faço parte da Casa Rosa, que me proporciona momentos incríveis, além de outros projetos também”, conta Lúbia.
Já Maria fala sobre o tratamento na Afecc: “Eu faço de tudo lá. Tenho psicólogo, psiquiatra, biodança e muito mais. Atualmente, minha vida está sendo essa, de casa para o hospital, do hospital para casa. Mas sou guerreira e estou me recuperando”.
Pesquisas e índices
Um estudo feito por pesquisadores do Caism, para o período de 2000 até 2017, apontou as significativas diferenças no acesso às políticas de controle do câncer de mama. Segundo o trabalho “Estudo sobre as disparidades raciais na mortalidade por câncer de mama de 2000 a 2017, em São Paulo: uma retrospectiva de base populacional”, existe uma tendência de aumento na taxa de mortalidade pela doença em mulheres pretas e pardas, e de redução em mulheres brancas.
A pesquisadora, que fez parte do Caism, diz que há uma desigualdade no acesso às políticas de controle de câncer em função da raça. Para grande parte da população brasileira, este é o único meio para tratamento que podem contar e, segundo Ministério da Saúde, cerca de 67% da comunidade do SUS se autodeclara preta ou parda.
Uma cartilha, instituída em 2009 por meio da Portaria nº 992, informa que a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra visa promover a saúde da população negra, priorizando a redução das desigualdades étnico-raciais, o combate ao racismo e à discriminação nas instituições.
Projeto Prevenir
Criado pelo Sicoob, todos os anos, entre os meses de outubro a dezembro, o Projeto Prevenir pretende colaborar para o aumento do acesso à informação e ao diagnóstico precoce do câncer. Clínicas parceiras e as secretarias de saúde dos municípios se tornam a ponte para a oferta do exame gratuitamente, especialmente em locais que possuem grandes filas de espera.
A seleção é realizada por hospitais, considerando os critérios de prioridade do Sistema Único de Saúde (SUS) para a realização dos exames. Os gastos serão custeados pela instituição financeira cooperativa.
Em algumas localidades, são abertas inscrições nas agências do Sicoob ou por aplicativo para quem precisa fazer os exames. A prioridade é dada para as pessoas que aguardam uma oportunidade na fila de espera do SUS.
Uma vez que os exames estejam prontos, as pacientes passam por consulta médica para avaliação dos resultados e, caso necessário, são encaminhadas para tratamento. Este ano foram ofertadas 14 mil mamografias.
Com supervisão de Leonardo Sales.
Retirada da mama, perucas e apoio: a luta de mulheres para combater o câncer