Há certa divergência entre os historiadores sobre a origem da devoção do capixaba católico à Nossa Senhora da Penha (leia mais sobre isso aqui). Mas, desavenças à parte, desde que o Frei Pedro Palácios resolveu construir uma ermida em homenagem à Nossa Senhora no alto de um penhasco em 1566, a associação se deu, tornando bizantina a discussão em torno do “Penha”: se uma autêntica referência à Nossa Senhora da Penha de França ou apenas um indicativo da localização do santuário (penha, de penhasco). Não por acaso, Nossa Senhora da Penha foi escolhida pelo Papa Urbano VIII, em 1630, como protetora do Espírito Santo, sendo confirmada como padroeira em 1908.
Toda essa devoção tem o seu auge na famosa Festa da Penha, que ocorre todos os anos após o oitavário pascoal. Essa é, sem dúvida, a maior expressão do turismo religioso no Espírito Santo, tamanha a quantidade de devotos que se deslocam até aqui para participar das atividades e celebrações. Ela é considerada a terceira maior festa religiosa do país, atrás apenas da Festa da Padroeira do Brasil, em Aparecida, e do Círio de Nazaré, em Belém.
São 9 dias de eventos e celebrações inteiramente dedicados à Nossa Senhora. Além das missas do chamado oitavário da Penha, destacam-se as famosas romarias, que reúnem determinados grupos de devotos em peregrinação ao santuário. Há registros históricos de uma primeira romaria feita em 1573 por sobreviventes de um naufrágio na Foz do Rio Doce até o Convento da Penha para agradecer o milagre (leia aqui). De lá pra cá, as romarias viraram tradição na Festa da Penha e, a cada ano, ganham novos adeptos.
Tem romaria dos militares, das mulheres, dos motociclistas, dos advogados, dos cavaleiros, dos ciclistas e até romaria de pessoas com deficiência. Mas, sem dúvida alguma, a mais famosa delas e a que reúne o maior número de pessoas é a Romaria dos Homens, realizada na noite de sábado (penúltimo dia da Festa).
Iniciada em 1958, a Romaria dos Homens foi originalmente organizada para demonstrar a fé e a devoção mariana do homens. 58 anos depois já não se pode dizer que ela é exclusivamente deles. Todos os anos uma multidão sempre crescente de homens, mulheres e crianças se reúne na Catedral Metropolitana de Vitória para seguir em caminhada até o Convento da Penha, em Vila Velha, carregando a imagem de Nossa Senhora ao som de cânticos e orações.
Milhares de velas são distribuídas aos romeiros por stands de comunidades católicas instalados nos arredores da Catedral. A onda de luz vai, aos poucos, se espalhando e a visão daqueles múltiplos pontos luminosos demarcando a passarela de gente em meio à noite escura é incrível!
Nas ruelas estreitas do centro de Vitória, a caminhada fica mais difícil e vagarosa pela maior densidade de pessoas por m2. Mas já na chegada à Rua Pedro Nolasco – antes da subida na Segunda Ponte – a amplitude aumenta e a multidão caminha mais confortavelmente.
A visão mais ampla que você pode ter do contingente de pessoas caminhando é no alto da Segunda Ponte. De um lado, o pessoal que vem de Vitória; do outro, os que já seguem por Vila Velha. Em ambos, a quantidade de romeiros ultrapassa facilmente o seu campo de visão.
Quando se chega à Avenida Carlos Lindemberg, na altura do bairro Aribiri, em Vila Velha, vê-se de longe o destino final da caminhada: o Convento da Penha. A visão do Convento dá um fôlego novo e a sensação de proximidade – apesar de levemente exagerada – alivia o cansaço. A partir daí, ele reina soberano no horizonte dos romeiros.
O percurso todo tem 14 km de extensão. Como eu já disse, os romeiros saem da Catedral de Vitória – logo após a missa de envio, celebrada às 18h – e seguem até o Convento da Penha, passando pela Segunda Ponte. São aproximadamente 4 horas de caminhada até a chegada à Prainha, em Vila Velha, onde fica o palco principal da Festa. Ali, após a chegada da imagem de Nossa Senhora (aproximadamente às 23h), é celebrada outra missa com a participação de sacerdotes de todo o Estado. Telões espalhados pelo descampado ajudam os fiéis exaustos a acompanhar a cerimônia que costuma varar a madrugada.
Informações úteis:
Do ponto de vista religioso, a romaria termina com a missa na Prainha. Mas, do ponto de vista turístico, a romaria pode acabar antes por causa da logística da volta pra casa. Não é nada fácil se desvencilhar da multidão para pegar um ônibus ou táxi. Por isso, quanto antes você “desembarcar” da peregrinação, melhor.
Ainda sobre a logística para participar da romaria, há várias alternativas para tentar minimizar os transtornos da ida e da volta. Você pode:
1) ir e voltar de ônibus da Romaria, aproveitando que a Ceturb coloca linhas especiais para atender a demanda;
2) combinar o transfer da ida e da volta com algum motorista de van; e
3) ir de carro até Vila Velha no meio da tarde e estacioná-lo nos arredores da Prainha para ter a comodidade de ir de ônibus, mas voltar no seu próprio carro.
Em qualquer caso, só é bom evitar ir de carro para o centro de Vitória no início da Romaria porque a probabilidade de achar uma vaga por lá é mínima.
Ao longo do trajeto, você encontra inúmeros ambulantes vendendo água e lanches rápidos. Eu, no entanto, preferi levar meu próprio lanche numa mochila para evitar parar e ficar pra trás na multidão. 5 minutos de parada representam milhares de pessoas na sua frente. Pra quem quer acompanhar de perto a imagem de Nossa Senhora, essa não é uma boa ideia.
Também há banheiros químicos em alguns pontos do trajeto. Mas, pelo mesmo motivo acima, parar e enfrentar a pequena grande fila dos banheiros pode te levar lá pro final da Romaria. Se essa não é a sua intenção, evite ao máximo ir ao banheiro. Vá antes da Romaria e beba quantidades pequenas e espaçadas de água. 4 horas não é um período tão longo assim.