Com a presença do presidente chinês Xi Jinping, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez um discurso firme na reunião virtual do BRICS, no qual criticou a imposição de tarifas como instrumento de pressão entre países.
Sem citar nomes, o chefe de Estado brasileiro fez referência ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao afirmar que medidas unilaterais vêm corroendo de maneira rápida e irresponsável os alicerces da ordem mundial.
Participação de Xi Jinping e defesa do multilateralismo
A cúpula, conduzida por Lula, reuniu o presidente chinês Xi Jinping, o presidente russo Vladimir Putin, o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa e outros líderes internacionais.
Xi Jinping afirmou que o mundo passa por uma transformação acelerada, como não se via há um século, e alertou para o aumento do hegemonismo, do unilateralismo e do protecionismo, que estariam cada vez mais descontrolados.
Segundo o presidente chinês, os países do BRICS, na vanguarda do Sul Global, têm a responsabilidade de sustentar o multilateralismo e o regime multilateral de comércio.
Destacou a necessidade de construir uma comunidade com futuro compartilhado para a humanidade, o que exige políticas de abertura, inclusão e cooperação em benefício mútuo.
Em seu discurso, intitulado “Avançando em Solidariedade e Cooperação”, apresentou três propostas voltadas a esses objetivos.
Primeira proposta: fortalecer o multilateralismo
A primeira proposta de Xi foi a defesa do multilateralismo como mecanismo para assegurar maior equidade e justiça nas relações internacionais.
Ele afirmou que o multilateralismo representa “a aspiração comum dos povos e a tendência predominante do nosso tempo”, sendo fundamental para a manutenção da paz e do desenvolvimento global.
Xi citou a Iniciativa de Governança Global, destinada a estimular ações conjuntas por um sistema de governança internacional mais justo e equilibrado. Defendeu ampla consulta e contribuição mútua, preservando o papel central da ONU e uma ordem baseada no direito internacional.
Afirmou ser necessário ampliar a representação e a voz do Sul Global nas decisões globais, propondo reformas que mobilizem recursos de todas as partes para enfrentar, de forma mais eficaz, desafios comuns.
Segunda proposta: promover abertura e cooperação
A segunda proposta apontou a abertura e a cooperação mutuamente vantajosas como meios de proteger a ordem econômica e comercial internacional.
Para Xi, a globalização econômica é uma tendência histórica irreversível e nenhum país consegue prosperar isoladamente.
Defendeu que os membros do BRICS devem empenhar-se na construção de uma economia mundial aberta e combater todas as formas de protecionismo.
Ressaltou a importância de preservar o sistema de comércio multilateral, com a Organização Mundial do Comércio em posição central.
Para ele, o desenvolvimento deve figurar no núcleo da agenda internacional, e os países do Sul Global precisam participar da cooperação em condições de igualdade: os benefícios só serão amplamente partilhados se todos tiverem acesso justo às oportunidades.
Terceira proposta: reforçar a solidariedade para o desenvolvimento
A terceira proposta defende a manutenção da solidariedade e da cooperação para criar sinergias que promovam o desenvolvimento comum.
Xi lembrou que os países do BRICS somam quase metade da população mundial, respondem por cerca de 30% da produção econômica global e por um quinto do comércio mundial.
Afirmou que, quanto mais integrado o bloco agir, maior será sua resiliência e eficácia diante de riscos externos, e declarou a disposição da China em implementar a Iniciativa de Desenvolvimento Global em parceria com os demais membros.
Disse também que a China pretende fomentar cooperação de alta qualidade no âmbito do Cinturão e Rota, aprofundar iniciativas práticas e aumentar a produtividade nos setores empresarial, financeiro, científico e tecnológico, visando gerar resultados concretos para as populações e ampliar a influência do BRICS.
Apoio de outros líderes e críticas ao unilateralismo
Outros chefes de Estado na cúpula criticaram ações unilateralistas e práticas de intimidação que, segundo eles, ameaçam o direito internacional e usam o comércio como forma de ingerência em assuntos internos, comprometendo a paz e o desenvolvimento.
Destacaram a necessidade de o BRICS fortalecer a solidariedade, coordenar respostas a crises e defender um sistema internacional de comércio livre e aberto.
Afirmaram igualmente que os interesses do Sul Global devem ser protegidos contra práticas que enfraquecem as normas multilaterais.
Elogiaram a Iniciativa de Governança Global proposta por Xi, afirmando que ela oferece uma direção clara para aprimorar a governança global e pode reforçar a representação dos países em desenvolvimento.
Conflitos globais e busca por soluções conjuntas
Na reunião, os líderes concordaram em manter o diálogo sobre conflitos em curso, como a guerra na Ucrânia e a crise em Gaza, e defenderam o uso do Grupo de Amigos pela Paz para buscar uma solução diplomática para a crise ucraniana.
Reafirmaram apoio à fórmula de dois Estados para o conflito entre Israel e Palestina, indicando que essa é a via mais eficaz para preservar a paz e a estabilidade no Oriente Médio e evitar novos ciclos de violência.
Defenderam que os membros do BRICS atuem de forma unida e responsável diante de conflitos, privilegiando sempre o diálogo e as negociações, já que a cooperação interna ao bloco pode contribuir para reduzir tensões e abrir caminho a acordos duradouros.
Papel do BRICS na estabilidade global
Especialistas também comentaram as propostas apresentadas: Wang Lei, diretor do Centro de Pesquisa de Cooperação do BRICS na Universidade Normal de Pequim, considerou as ideias de Xi “muito elucidativas” e capazes de oferecer orientações relevantes para enfrentar os desafios atuais.
Segundo Wang, o BRICS desempenha um papel significativo no sistema político e econômico mundial e pode contribuir para a estabilidade global.
Por isso, defendeu o aprofundamento da solidariedade e da cooperação entre os países do bloco, o que também apoiaria reformas do sistema multilateral.
Para Wang, a atuação conjunta é determinante: pode equilibrar as relações internacionais, apresentar alternativas a tensões comerciais e políticas, e quanto mais coesos os membros, maior será a capacidade do grupo de influenciar mudanças estruturais no cenário global.








