Quem nunca ficou checando o celular repetidamente esperando por uma mensagem que demora a chegar? Ou enviou um simples “oi” em momentos que, no fundo, não eram os mais adequados? Essas situações aparentemente comuns revelam que a busca por conexão muitas vezes surge da carência emocional, transformando-se em urgência e até mesmo em sofrimento silencioso.
Quando falta a conexão presencial
Especializada em saúde mental, a neuropsicóloga Luciana Benedetto explica que, nessas situações, o cérebro busca contato de forma compulsiva, e o sistema de recompensa regulado pela dopamina age de forma desequilibrada.
“É comum aceitar interações que não estão alinhadas aos próprios valores ou insistir em contatos sem reciprocidade. O alívio é momentâneo, mas rapidamente dá lugar a um vazio”, afirma.
Alguns dos indícios mais claros desse comportamento são o hábito de checar notificações sem parar, enviar mensagens em horários inadequados ou sentir-se vazio logo após uma interação. A diferença está na motivação por trás dessas ações.
“O desejo genuíno de se conectar nasce de escolhas conscientes e da vontade de compartilhar, sem pressa ou urgência. Já a carência emocional vem acompanhada de ansiedade, medo de rejeição e uma necessidade de preenchimento. É importante observar se a decisão parte de uma reflexão alinhada aos próprios valores ou de uma urgência por validação”, ressalta a especialista.
A psiquiatra Aline Sabino, da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, alerta que esse padrão pode criar uma dependência difícil de superar.
“O uso constante de redes sociais intensifica a solidão, especialmente quando predominam interações superficiais e busca por aprovação. A ativação frequente do sistema de recompensa leva a um ciclo de frustração, aumentando a sensação de inadequação e isolamento”, explica.
Luciana complementa: “A motivação verdadeira ativa o córtex pré-frontal, ligado a decisões conscientes e empatia. Já a carência estimula principalmente a amígdala, associada ao medo e a respostas impulsivas“.
Identificando os sinais da carência emocional
Segundo Aline, alguns sinais internos ajudam a perceber quando a busca por atenção deixou de ser saudável. Entre eles:
- Sensação de vazio após interações, mesmo diante de elogios ou alto engajamento;
- Ansiedade ou urgência por respostas, com compulsão por checar notificações;
- Incoerência emocional, quando há desalinhamento entre ações e valores pessoais;
- Busca por validação como alívio momentâneo, usando o engajamento digital para compensar inseguranças;
- Dificuldade em lidar com o silêncio, com desconforto na ausência de estímulos externos.
A psiquiatra destaca que o ambiente digital amplifica esse vazio, pois elimina elementos essenciais da empatia.
“A falta de expressões faciais e contato físico reduz a percepção empática e aumenta a sensação de isolamento. Nas interações presenciais, a comunicação não verbal e o suporte físico ativam circuitos neurais ligados ao afeto, promovendo segurança emocional.”
A presença física e o contato visual estimulam a liberação de ocitocina, conhecida como o “hormônio do afeto“. A falta dessa troca pode minar a autoestima, aumentar inseguranças e reforçar a dependência da aprovação alheia.
“Sem gestos sutis, tom de voz e expressões faciais, o cérebro perde parte da informação necessária para avaliar o próprio valor”, explica.
Aline reforça que a carência prolongada enfraquece a construção de uma autoimagem sólida, favorecendo crenças de inadequação e mantendo o sistema emocional em estado de alerta constante.
Estabelecendo limites saudáveis nas relações
Em um mundo que parece exigir respostas imediatas, respeitar o próprio tempo é fundamental. Isso envolve responder quando possível, selecionar o que compartilhar e investir em relações que valorizem qualidade em vez de quantidade. “Limites não significam distanciamento, mas cuidado consigo mesmo”, afirma Luciana.
“Observar sinais de cansaço, comunicar-se de forma clara, entender que disponibilidade constante não é sinônimo de afeto e priorizar relações alinhadas aos seus valores são estratégias que protegem a saúde mental”, recomenda Aline.
É possível treinar o cérebro para lidar melhor com a carência. A neuroplasticidade permite criar novas conexões ao longo da vida, e práticas como diário emocional, meditação, autoafirmação e momentos de qualidade consigo mesmo fortalecem a autonomia emocional.
“Quando a busca por atenção externa vira um paliativo emocional, é hora de se reconectar consigo mesmo através do silêncio, da presença e do autoconhecimento.”








