A Grande Vitória enfrenta um aumento significativo na poluição do ar por poeira sedimentável, popularmente conhecida como pó preto. Dados do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) revelam que, em 2024, a taxa de poluição cresceu 34% em relação ao ano anterior, atingindo 953,3 g/m², contra 709,17 g/m² em 2023. O problema é ainda mais grave quando comparado a 2018, com um aumento de 43%. As estações de monitoramento em Vitória, especialmente na Enseada do Suá e na Ilha do Boi, registraram os índices mais altos, com destaque para o Hotel Senac, onde houve um aumento de 97% nas emissões.
A situação é agravada pela falta de dados consistentes em algumas estações, como no Hotel Senac, onde os potes de medição foram encontrados de cabeça para baixo em dezembro de 2023, após um aumento recorde de 1.245,45% em novembro. Além disso, a ausência de registros em maio e junho de 2023 em várias estações dificulta a análise precisa da evolução da poluição. Essas lacunas evidenciam a fragilidade do sistema de monitoramento da qualidade do ar na região.
Lei da Qualidade do Ar suspensa e investimentos bilionários
Em meio ao cenário crítico, a Lei da Qualidade do Ar de Vitória, sancionada em dezembro de 2023, foi suspensa por uma decisão liminar do desembargador Fernando Zardini Antonio. A lei, que propunha padrões mais restritivos para o controle da poluição atmosférica, foi alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pela Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes). O Ministério Público do Estado (MPES) emitiu parecer favorável à inconstitucionalidade, o que gerou críticas de ambientalistas e do ex-vereador André Moreira (Psol), principal idealizador do projeto.
Enquanto a legislação ambiental enfrenta obstáculos, a ArcelorMittal anunciou um investimento de R$ 3,8 bilhões no Complexo de Tubarão, ampliando a produção de tiras de aço. O governador Renato Casagrande (PSB) celebrou o anúncio como o “maior investimento privado da história do Espírito Santo”. No entanto, o presidente da Juntos SOS ES Ambiental, Eraylton Moreschi, questionou publicamente os critérios técnicos para a liberação das licenças ambientais, destacando a necessidade de alinhar o crescimento industrial com a redução das emissões de gases de efeito estufa, conforme previsto na Política Estadual de Mudanças Climáticas.
Monitoramento e impactos na saúde
O Iema atribui o aumento da poluição a fatores como obras de construção civil, circulação de veículos e condições meteorológicas desfavoráveis à dispersão de poluentes. No entanto, a falta de um inventário atualizado das fontes de poluição, com dados que remontam a 2015, dificulta a adoção de medidas eficazes. A professora Elisa Valentim Goulart, do Núcleo de Pesquisa em Qualidade do Ar da Ufes, defende a atualização desses dados para embasar políticas públicas mais assertivas.
Desde o início de 2024, o Iema disponibilizou um sistema online para que a população monitore a qualidade do ar em tempo real. O sistema classifica a qualidade do ar em cinco níveis, de “bom” a “péssimo”, com base na concentração de gases poluentes e material particulado. Apesar disso, especialistas alertam que mesmo níveis considerados “bons” podem conter substâncias nocivas à saúde, reforçando a necessidade de maior transparência e conscientização pública.
O aumento da poluição do ar na Grande Vitória em 2024 expõe a urgência de políticas públicas mais robustas e transparentes. Enquanto investimentos bilionários são celebrados, a população continua exposta a níveis alarmantes de poluentes, com impactos diretos na saúde e no meio ambiente. A suspensão da Lei da Qualidade do Ar e a falta de dados atualizados sobre as fontes de poluição são desafios que exigem ação imediata do poder público e maior engajamento da sociedade civil.