Um quarto dos estudantes das escolas brasileiras não declarou sua raça no Censo Escolar de 2023, um dado alarmante que acende um alerta para a disparidade racial na educação do país. Em resposta, organizações educacionais lançaram uma campanha nesta semana com o objetivo de estimular a declaração racial no ato da matrícula escolar. Essa iniciativa é vista como uma ação crucial para a promoção da igualdade racial e a elaboração de políticas educacionais mais justas.
O Censo Escolar, conduzido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), representa a principal fonte de informações sobre a educação básica no Brasil. Neste ano, o país registrou 47,3 milhões de alunos matriculados em instituições públicas e privadas, sendo que 91% deles estão no ensino regular. Os dados indicam que 32,31% dos estudantes são brancos, 37,3% pardos, 3,7% pretos, com 0,4% amarelos e 0,8% indígenas. O mais preocupante é que 25,5%, equivalendo a mais de 12 milhões de alunos, não declararam sua raça.
A vice-presidente de Equidade Racial da Fundação Lemann, Alessandra Benedito, destaca que a ausência de declaração racial entre as crianças impacta negativamente na definição de políticas educativas e na busca pela equidade. “Isso influencia diretamente a infraestrutura e a organização do ensino, além de perpetuar as desigualdades raciais históricas”, afirma.
A campanha “Estudante Presente É Estudante que se Identifica”, promovida pela Fundação Lemann e outras entidades, tem como meta sensibilizar todas as partes envolvidas na educação – desde famílias até gestores escolares – sobre a importância da declaração racial durante o processo de matrícula. Segundo os organizadores, esse é um momento fundamental para garantir que as informações sejam corretamente registradas para fins de políticas públicas.
Entre 2007 e 2016, a proporção de estudantes sem declaração racial no Censo Escolar caiu de 60,3% para 29%. Contudo, esse progresso desacelerou nos anos subsequentes, com uma redução modesta de apenas 1,5 ponto percentual de 2016 a 2022. O último levantamento, porém, mostra uma redução significativa de dois pontos percentuais de 2022 para 2023, indicando um possível retorno à tendência de queda.
Alessandra defende que a mobilização para a declaração racial deve envolver todos os níveis da administração escolar. “Não é suficiente apenas preencher os dados, mas também analisá-los para que possamos implementar ações efetivas com base nesses resultados”, explica.
A coleta de dados precisos é vista como essencial para atacar o racismo e promover ações afirmativas, como as políticas de cotas no ensino superior. Geovanny Silva, coordenador de finanças do Movimento Negro Unificado no Distrito Federal, ressalta a importância dos dados na formulação de políticas públicas que considerem as especificidades sociais e raciais dos estudantes.
A Lei de Cotas determina que 50% das vagas em universidades federais e instituições de ensino técnico sejam reservadas para estudantes de escolas públicas, incluindo uma porcentagem específica para alunos pretos, pardos e indígenas. “Com dados claros, podemos identificar as realidades nas escolas e moldar políticas públicas que reconheçam a diversidade racial, além de repararem a injustiça histórica vivida pela população negra”, conclui Silva.
O público pode acessar mais informações sobre a campanha na internet. Além da Fundação Lemann, a iniciativa conta com a colaboração da Associação Bem Comum, Nova Escola, Centro Lemann, Motriz e Reúna, em parceria com a Fundação Roberto Marinho, Instituto Natura e Ensina Brasil.