A expressão que dá título a esse texto é de Jean-Paul Sartre, e aparece na sua peça de teatro Huis Clos (Entre quatro paredes, na tradução brasileira).
Diferente do que pode parecer, o inferno não é o outro porque ele/a não sou eu… A peça de Sartre mostra, ao contrário, que o outro é fundamental para o conhecimento que temos de nós mesmos. Ou, dito de outra forma, precisamos nos relacionar com o outro para construir a nossa identidade. Ainda nessa peça, Sartre afirma que a pessoa “nada mais é do que a soma das escolhas que fez durante sua vida”.
Pensando nessa perspectiva de Sartre, e acompanhando as discussões de leitores dos articulistas de alguns jornais brasileiros (Folha, Estadão etc.), parece que há muito a aprender com o filósofo francês!
A marca registrada dos argumentos é o desprezo pelo outro por conta de ideias divergentes. Pouco interessa o assunto do artigo em questão. Se for uma crítica a alguma ação (ou falta dela) de lideranças políticas, logo aparecem defensores e detratores do líder, e o tema do artigo se torna irrelevante. Desaparece.
É compreensível que haja opiniões divergentes. Não se aprende e nem se cresce como indivíduo sem o convívio com o contraditório. Precisamos do outro. E o outro é, sempre, diferente de nós. Mas, para usar uma metáfora de domínio comum, o Fla-Flu que virou a discussão política tem demonstrado muito da intolerância que já estava instalada nas identidades.
Tente dialogar com os extremos e perceberá rapidamente a repetição de argumentos alheios, emprestados, na maioria das vezes sem verificação séria de sua veracidade, porque receberam no Whatsapp! Tente argumentar e perceberá que o outro “já tem uma opinião formada sobre tudo”.
Em certo sentido, e em consonância com Sartre, as escolhas que os extremistas fazem determinam as opiniões que adotam. Nenhum problema com essas escolhas. Problema óbvio com a intolerância que demonstram com opiniões divergentes e com a intransigência em ouvir e pensar sobre os argumentos do outro.
Entendendo Sartre: porque o outro também é livre, não podemos controlar o que ele pensa e o que ele nos diz. É um limite que ele impõe à nossa liberdade. Mas precisamos dele para nos conhecer e somente quando encaramos o outro como alguém igualmente livre, podemos dar um sentido legítimo à nossa existência.
Resumindo, precisamos mais de Sartre e menos de Whatsapp e Telegram!
