5 de dezembro de 2025
sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Novo Ludismo ganha força com o avanço da IA

Há pouco tempo, em uma lanchonete, uma moça na faixa dos 20 anos perguntou a outra: “Posso saber qual modelo de celular você usa?”

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A resposta veio na hora: “Claro, é um Jelly Star.” Enquanto elas conversavam, fui pesquisar o aparelho na internet.

A interação foi breve, mas ambas comentavam sobre o dispositivo como quem admira um calçado: “Que interessante, parece prático, onde comprou? Também quero um.”

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O fenômeno dos smartphones compactos

O Jelly Star é um aparelho com dimensões semelhantes a um cartão bancário que roda Android. Possui todas as funções básicas: envio de mensagens, chamadas, e‑mail e GPS. Contudo, seu display de apenas 3 polegadas — cerca de metade da tela de um smartphone convencional — é tão pequeno que, segundo entusiastas no Reddit, incomoda quando usado por longos períodos.

“É pequeno demais para criar dependência, e seu uso prolongado causa desconforto visual, ideal para desestimular o vício”, afirmou um participante do r/dumbphones, comunidade que defende a “adoção de hábitos mais simples e desconectados”.

O novo movimento ludista

Esse posicionamento — mais uma recusa espontânea do que um protesto organizado — vai além dos aparelhos compactos. Observa-se um ressurgimento legítimo do pensamento ludista entre jovens da geração Z, que têm rejeitado plataformas digitais que, nos últimos 20 anos, competem por nossa atenção e por recursos financeiros, tendência que se intensifica à medida que redes como Instagram e TikTok são dominadas por conteúdo produzido por inteligência artificial.

Os primeiros ludistas foram operários têxteis da Inglaterra do século XIX que se insurgiram contra máquinas automatizadas que lhes tiravam empregos. Hoje, embora o termo às vezes seja usado pejorativamente para descrever resistência à tecnologia, seus equivalentes contemporâneos estão ressignificando o conceito.

Segundo o especialista em tecnologia Brian Merchant, como seus predecessores, os novos ludistas não combatem a tecnologia em si, mas o uso exploratório dela. Muitos desses adeptos, longe de serem alienados, cresceram imersos em dispositivos digitais e entendem bem seu potencial viciante.

Manifestações e mudanças de comportamento

Dezenas de pessoas se reuniram em Nova Iorque para um evento do “Movimento Ludista”. A organização sem fins lucrativos Clube Ludista, criada por ex‑dependentes de telas no Brooklyn, já tem mais de 20 unidades em instituições educacionais norte‑americanas.

As vendas de celulares simplificados, chamados “dumbphones”, têm crescido de forma expressiva, segundo o colega Tom Page, que citou estudos que associam tempo de tela a distúrbios do sono e a problemas psicológicos, sobretudo entre jovens. O Wall Street Journal destacou o fascínio da geração Z por tecnologias retrô, como celulares flip e câmeras analógicas. Até mídias físicas como vinis e CDs voltaram a ganhar espaço.

O humorista Caleb Hearon, de 30 anos, costuma brincar sobre sua relação conturbada com o smartphone: “Desligo o aparelho, guardo na gaveta e saio. Repito isso semanalmente”, confessou em podcast recente.

O cansaço da hiperconexão

Para Merchant, esse desencanto aconteceu aos poucos, mas “muitos estão atingindo seu limite atual”. Ele afirma: “Tudo se resume à insatisfação com desenvolvimentos tecnológicos antidemocráticos focados em lucro. A questão não é ter uma tela no bolso, e sim sua saturação por aplicativos tóxicos criados por corporações do Vale do Silício para servir interesses restritos”.

Agimos como operários na fábrica digital: geramos imagens, produzimos conteúdo e interagimos com propagandas. Esse trabalho alimenta um sistema desigual em que gigantes como Meta, Google e Amazon acumulam riqueza, enquanto recebemos produtos projetados para manter nosso engajamento constante.

O futuro das redes sociais

Embora essas plataformas tenham valor — por exemplo, para acompanhar conquistas de amigos —, o conteúdo orgânico vem ficando cada vez mais raro. Kyle Chayka, do The New Yorker, sugeriu que caminhamos para o “Posting Zero”, um momento em que usuários comuns deixarão de compartilhar nas redes, cansados do excesso.

Sem postagens cotidianas de pessoas reais, restarão apenas “propagandas corporativas, conteúdo artificial de baixa qualidade e influenciadores desesperados por atenção em busca de audiências minguantes”, segundo Chayka.

Executivos do setor não ignoram a tendência. No começo do ano, Mark Zuckerberg antecipou um futuro em que “amigos virtuais” superarão interações humanas. “Seu feed terá elementos que permitirão diálogo e interação com inteligências artificiais”, previu.

Essa abordagem pode manter usuários engajados, mas também pode borrar ainda mais a fronteira entre realidade e ficção, aumentando a reação contra a invasão tecnológica. Como disse Merchant: “Se a desinformação por IA se tornar ubíqua, muitas pessoas simplesmente abandonarão tudo”.

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