Outubro marca o início de uma das campanhas mais importantes no cenário da saúde pública mundial, movimento dedicado à conscientização sobre o câncer de mama. No ano de 2022, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença atingiu mais de 2 milhões de mulheres em todo o mundo, já no Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), são estimados mais de 73 mil novos casos para cada ano do triênio 2023-2025.
A grande vantagem, no entanto, está na possibilidade de um diagnóstico precoce, que pode salvar muitas vidas. De acordo com a Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (FEMAMA), quando o câncer de mama é detectado em estágios iniciais, as chances de cura podem chegar a 95%. Isso reforça a relevância das campanhas de conscientização como o Outubro Rosa, que não apenas educam sobre os fatores de risco e sinais de alerta, mas também pressionam por políticas públicas que garantam acesso aos exames essenciais, como a mamografia.
O Outubro Rosa também coloca em pauta o impacto da doença na qualidade de vida das mulheres, ressaltando a necessidade de promover o autocuidado, o conhecimento sobre os direitos à saúde e o incentivo ao acompanhamento médico regular. A iniciativa tem o poder de influenciar mudanças importantes no sistema de saúde, tanto no Brasil quanto em outros países, especialmente no que diz respeito ao acesso a tecnologias de diagnóstico e tratamento. Essas ações são fundamentais para reduzir as desigualdades regionais e socioeconômicas que ainda dificultam o diagnóstico precoce e o tratamento adequado em muitas áreas do país.
Mamografia e o desafio do acesso
O câncer de mama continua sendo a principal causa de morte por tumores entre as mulheres no mundo, com 669.418 óbitos em 2022. Além das dificuldades de acesso à mamografia, outro fator que contribui para essa estatística alarmante é a ausência de políticas eficazes de prevenção da doença. Mudanças no estilo de vida, como o combate ao sedentarismo e à obesidade, a prática regular de exercícios e o abandono do tabagismo e do consumo de álcool, são medidas essenciais que ainda não estão amplamente disponíveis para todas as mulheres, especialmente nas populações mais vulneráveis.
“A mamografia é o exame mais importante na detecção precoce e deve ser feita a partir dos 40 anos. Ela é fundamental para aumentar as chances de cura e, por diagnosticar a doença em estágios mais iniciais, pode levar a tratamentos menos agressivos garantindo assim mais qualidade de vida durante o tratamento, explica Max Mano, líder nacional da especialidade tumores de mama da Oncoclínicas. “Contudo, em países em desenvolvimento, como o Brasil, o acesso ao exame ainda enfrenta barreiras significativas, especialmente fora dos grandes centros urbanos. Por isso, precisamos sempre reforçar a necessidade de ampliar a disponibilidade de mamógrafos nas regiões mais remotas e promover e facilitar o acesso ao exame”, completa o oncologista.
“O impacto é ainda maior entre as mulheres de baixa renda, que têm menos acesso a essas políticas de prevenção. A falta de investimentos em políticas públicas eficientes acaba condenando essas mulheres a um atraso de décadas no combate à doença, quando comparadas aos países desenvolvidos”, alerta Mano.
Diagnóstico tardio no Brasil
A realidade dos países em desenvolvimento, como o Brasil, é de um alto número de diagnósticos tardios. Em 2022, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, o câncer de mama foi responsável por 22.189 mortes de mulheres brasileiras, segundo o Inca. Isso se deve, em grande parte, ao fato de muitos casos só serem descobertos em estágios avançados da doença.
“Ainda temos uma alta taxa de diagnósticos em fases avançadas, como os estágios 2 e 3, o que reduz significativamente as chances de cura. Além disso, a desigualdade no acesso a tratamentos modernos contribui para essa letalidade”, afirma Mano. Segundo o estudo AMAZONA, publicado na revista Breast Cancer Research Treatment, mais de 70% dos diagnósticos de câncer de mama no Brasil são feitos quando a doença já está em estágios avançados, o que também aumenta a complexidade e os custos do tratamento.
O autoexame como ferramenta de autoconhecimento, mas não de diagnóstico
Apesar de o autoexame das mamas ser uma prática relevante para que a mulher conheça melhor o próprio corpo, ele não deve ser utilizado como método de diagnóstico e não substitui a realização de exames clínicos, como a mamografia. Mesmo com a recomendação de sociedades médicas para que o exame seja realizado anualmente a partir dos 40 anos, muitas mulheres ainda desconhecem essa orientação. Esse é um dos achados da pesquisa “Câncer de Mama no Brasil: Desafios e Direitos”, realizada pelo Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria), que entrevistou 1.400 mulheres com mais de 20 anos em São Paulo (capital) e nas regiões metropolitanas de Belém (PA), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ) e Distrito Federal.
O estudo revelou que uma em cada quatro mulheres (40%) acredita que a mamografia só é necessária quando outros exames, como o ultrassom, indicam alterações. Além disso, 17% das entrevistadas não sabem se a mamografia é adequada ou não. Outro dado preocupante é que 48% das mulheres acreditam que, após uma mamografia sem detecção de lesões, basta realizar apenas o autoexame em casa.
A falsa ideia de que o autoexame é a principal forma de detectar precocemente o câncer de mama também foi identificada: 63% das entrevistadas acreditam nisso, sendo que esse índice sobe para 68% entre mulheres com 60 anos ou mais, justamente a faixa etária com maior risco para a doença. Apesar de o autoexame ser uma ferramenta valiosa para promover o autoconhecimento, ele não é capaz de detectar o câncer em suas fases iniciais de forma confiável. Muitas vezes, os nódulos só se tornam palpáveis quando a doença já está em estágio mais avançado, o que pode comprometer as chances de cura e de um tratamento menos agressivo.
“A mamografia pode identificar tumores menores que 1 cm, que muitas vezes não são detectáveis ao toque. Por isso, ela é recomendada anualmente para mulheres a partir dos 40 anos; dependendo da existência de outros fatores de risco, como histórico familiar da doença. Além disso, os exames mamários de rastreamento (nesse caso, não necessariamente a mamografia) podem precisar ser iniciados antes dos 40 anos. Sem o exame de imagem, a mulher pode deixar de identificar a doença em estágio inicial, quando as chances de sucesso no tratamento são maiores”, diz Max Mano.
Outro ponto importante é que o autoexame, apesar de ser uma prática simples e acessível, pode gerar uma falsa sensação de segurança quando não encontra alterações visíveis. Isso pode fazer com que algumas mulheres adiem a realização de exames mais precisos, como a mamografia. “É essencial que as campanhas de conscientização reforcem que o autoexame não substitui a mamografia e que o acompanhamento médico regular é indispensável. Por isso, o foco das políticas de saúde deve continuar sendo o acesso a exames como a mamografia, especialmente em regiões onde o equipamento ainda é escasso, ou o acesso difícil por questões sociais e/ou culturais”, destaca.