O deputado Guilherme Derrite (PP-SP), responsável pelo parecer do projeto Antifacção, tem acumulado erros e recuos desde que foi designado para formular o relatório. Após divulgar a quarta versão em seis dias, a proposta está agora agendada para ser apreciada na próxima terça-feira.
Desde que foi escolhido relator, na última sexta-feira, Derrite só deixou de publicar novas versões durante o fim de semana. A redação mais recente ainda não reuniu apoio e segue alvo de críticas.
O parlamentar, que se afastou temporariamente do cargo de secretário de Segurança no governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) em São Paulo, recebeu a relatoria atendendo a uma demanda do seu partido, o PP.
A escolha desagradou integrantes do governo, e o relator não foi convidado para uma reunião entre o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Nesta quarta-feira, Derrite buscou um acordo para a votação ao se reunir com bancadas do Republicanos, PSD, PP e União Brasil, e manteve encontros com governadores e parlamentares tanto do governo quanto da oposição.
Reações internas e pedidos de adiamento
Membros do mesmo campo político do relator, alinhados ao bolsonarismo, também criticaram a proposta por considerá-la prematura para apreciação. Entre os que pediram o adiamento estiveram o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), e o governador do Rio, Claudio Castro (PL), que afirmou que “não interessa em nada aprovar uma proposta que vai ficar parada no Senado ou ser considerada inconstitucional”.
No encontro com deputados do PSD, manifestaram-se preocupações de que o relatório comprometesse o financiamento da Polícia Federal. Parlamentares como Laura Carneiro (PSD-RJ) e Aluísio Mendes (Republicanos-MA), este último policial federal e presente em parte das reuniões de Derrite na quarta-feira, solicitaram mudanças adicionais para preservar a verba da PF.
Também na quarta-feira, o relator se reuniu com o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Manoel Carlos de Almeida Neto, e com o líder do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL).
Demandas do governo
Em diálogo com o representante do ministério da Justiça e em conversas com o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), o Executivo indicou a necessidade de ajustes em vários pontos do texto, entre eles a questão da Polícia Federal, os prazos para o perdimento de bens e a sobreposição de normas.
Diante das sugestões recebidas, Derrite apresentou uma quarta versão do relatório que, segundo avaliação do governo, não atendeu integralmente aos pedidos apresentados.
Líderes próximos a Hugo Motta reconheceram a dificuldade de chegar a um consenso, mas evitam criticar diretamente o relator.
Isnaldo Bulhões destacou a disponibilidade do secretário-executivo do Ministério da Justiça, afirmando que ele tem atuado como interlocutor do tema e está à disposição de partidos e parlamentares para preservar a essência do texto, sem deturpações, e aperfeiçoá-lo para atender à intenção do legislador e às expectativas da população.
Conflitos em reuniões
Em um momento de maior tensão, o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), e Hugo Motta tiveram um desentendimento acalorado durante a reunião de líderes na terça-feira por causa do projeto; o petista criticou a redação de Derrite, enquanto Motta reagiu defendendo com vigor o trabalho do relator.
Sobre a Polícia Federal, foram realizadas três tentativas de ajuste no texto visando um acordo com a corporação, sem que, até o momento, haja entendimento entre as partes.
Na segunda-feira, Derrite e Motta mantiveram conversa telefônica com o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues. Após o diálogo, relator e presidente da Câmara anunciaram alterações no texto e a previsão de um consenso com a PF, o que não se concretizou, pois, mesmo com alterações na redação, ainda havia lacunas que poderiam reduzir o protagonismo da PF em relação às forças estaduais.
Na terceira versão do relatório, Derrite modificou os trechos que previam subordinação às forças estaduais, mas gerou novo impasse ao não explicitar o mecanismo de destinação de verbas para o financiamento da Polícia Federal. A quarta versão trouxe um novo ajuste, mas o governo considera necessário mencionar outro fundo no projeto.
Equivalência de penas e impacto na lei antiterrorismo
O acordo inicial para o texto, articulado também por Motta, previa equiparar as penas aplicáveis às facções às penalidades previstas para o crime de terrorismo.
A proposta tentava conciliar a oposição, que exigia enquadramento do crime organizado como terrorismo, e o governo, já que a redação não classificava formalmente as facções como terroristas.
Mesmo assim, o projeto sofreu várias críticas e aliados do governo lançaram uma campanha nas redes sociais contra Motta e Derrite. Entre os governistas passou a circular a narrativa de que as alterações, ainda sem qualificar as facções como terroristas, poderiam abrir espaço para intervenção estrangeira em razão da equiparação de penas.
Ao longo da semana, Derrite abandonou a intenção de mexer na lei antiterrorismo, mas surgiram outros problemas, com a oposição ameaçando resgatar esse ponto por meio da votação de destaques, analisando trechos em separado quando o projeto for ao plenário.
Em evento com governadores, o relator manifestou descontentamento com o que chamou de “guerra política”. Ao promover as alterações, evitou classificá-las como recuos, descrevendo-as como estratégia.
O relator afirmou que não se deve perder a oportunidade por disputas políticas e que é preciso priorizar a população que sofre sob o domínio do crime organizado, defendendo o aperfeiçoamento do texto em benefício do interesse público.








