A resposta pode parecer óbvia, ainda mais nos dias de hoje, em que podemos perceber uma junção forte da música e dos elementos da periferia na criação de coleções de marcas
voltadas para o streetwear.
A verdade é que, pesquisando um pouco mais, é possível observar como esses três elementos estão interligados.
Hoje em dia, a moda se constrói de forma política também, indo além de montar “lookinhos”
esteticamente bonitos para a internet, pois muita coisa pode ser expressada através dela.
De acordo com o filósofo Brunno Almeida Maia, mestre em filosofia pela Unesp, da origem etimológica “texere”, surgem as palavras “tecido” e “texto”, sustentando a ideia inicial de que
moda e literatura estão conectadas, afinal, quem tece algo, conta uma história.
Ao voltarmos nosso olhar para o streetwear capixaba, nos deparamos com a Barra Crew, marca responsável por desempenhar muito bem uma narrativa descolonizadora, pois se fixa num Brasil plural, estritamente nacional, negro, indígena, ribeirinha, pautado por costumes e crenças. A literatura aqui exerce o poder de reforçar o imaginário caiçara e de beira de praia, já que, através das referências aos livros, a matriz afro-indígena se faz presente.
Partindo para as coleções, há rastros, quase imperceptíveis, da literatura, sejam eles escritos, sejam eles orais. A “Local Union”, por exemplo, é uma camiseta que traz elementos visuais que se referem à cultura do Congo, como a casaca e o estandarte, além das pessoas responsáveis por carregar uma espécie de mastro, outro ícone importante para a cultura capixaba e também barrense.
O diferencial aqui reside em justamente apoiar-se nos escritos de Homero Bonadiman Galvêas, barrense, professor e pesquisador, encarregado por ter escrito um dos maiores patrimônios materiais e literários capixaba: o livro A História da Barra do Jucu “Gênese da Cultura capixaba | Desenvolvimento Sócio Cultural da Grande Vitória”.
O livro traça um histórico importante dos acontecimentos das terras barrenses, indo desde os primeiros habitantes daquelas terras – indígenas, negros e ribeirinhas – a até mesmo a situação da Barra e do Rio Jucu nos dias atuais. Além disso, o autor se debruça sobre a cultura local, uma vez que essa é vista como um agente essencial para a manutenção da comunidade barrense. Nessa parte específica do livro, descobrimos sobre a influência do congo, do carnaval, da folia de reis, da marujada, das lendas e crenças locais, das rendeiras e das comidas típicas.
Outra camiseta que mistura literatura e arte, trazendo um forte aspecto brasileiro, capixaba
e barrense é a “Folk-lore”, querida por muitos que acompanham a marca. Ela faz referência ao livro Folclore Brasileiro, marcado por ter sido um dos primeiros livros sobre o nosso folclore a ser publicado na Europa. É possível notar uma semelhança forte entre a camiseta e o prefácio do livro.
De um lado, a camiseta “Folk-lore”, de outro, o livro Folclore Brasileiro.
Na primeira parte do livro em que a poesia popular brasileira será versada, o autor nos conta sobre o significado dessa palavra tão particular que é o folclore, caracterizada por ser tudo aquilo que se relaciona a um povo: as lendas, as crenças, os contos, as tradições e as superstições.
Por último, analisando as duas camisetas abaixo, podemos notar uma sutil afinidade entre elas. Isso porque ambas camisetas foram inspiradas nas raízes do mangue, presente no livro Manual de Iconografia Capixaba, instrumento de valorização capixaba, no qual podemos encontrar ícones que remetem à cultura, ao patrimônio natural e à arquitetura do Estado do Espírito Santo.
Como pudemos observar, a arte e a literatura juntas desempenham um papel fundamental
na construção das coleções da Barra Crew, marca que tem crescido exponencialmente no
cenário do streetwear nacional e que temos orgulho de dizer que é do Espírito Santo.
Amei, muito importante ter essa conversa entre referências e mais ainda colocar elas em relevância, principalmente se tratando da cultura capixaba