Cineclube Orlando Bomfim: memória, resistência e cinema capixaba ocupam o Centro de Vitória
O Centro Cultural Triplex Vermelho volta a acender seu projetor nesta terça [25], às 19 horas, com mais uma sessão do Cineclube Orlando Bomfim. O nome não é mero detalhe: é uma homenagem direta a Orlando da Silva Rosa Bomfim Júnior, capixaba de Santa Teresa, jornalista, militante político e desaparecido pela ditadura militar em 1975. Ao assumir esse nome, o cineclube reivindica a história como guia e o cinema como espelho de um povo que insiste em lembrar aquilo que tentaram apagar.
A iniciativa existe há quatro anos e sempre marcou presença com sessões temáticas sobre datas políticas, sociais e culturais. Mas só agora, contemplado por edital da Lei Aldir Blanc, o projeto ganhou identidade oficial e um recorte curatorial ousado: dez filmes do diretor Orlando Bomfim Netto, filho do homenageado, cada um acompanhado por um filme complementar e um debate guiado por especialistas e pesquisadores. A ideia é usar a tela como ponto de partida para discutir temas que moldam o Espírito Santo: imigração, memória urbana, resistência indígena, cultura popular e a própria história do audiovisual capixaba.
O diretor de cinema Orlando Bomfim Netto (1941–2021), embora mineiro de nascimento, foi uma figura central e pioneira do documentarismo no Espírito Santo, estado onde se radicou em 1980, dedicando sua vasta obra, que inclui títulos como “Tutti Tutti Buona Gente” (1975), ao registro do cotidiano, da imigração italiana e da cultura popular capixaba, como o Ticumbi. Além de seu engajamento cultural, atuando na presidência do antigo Departamento Estadual de Cultura e na direção da TV Educativa, ele manteve um forte compromisso político e em defesa dos direitos humanos, dedicando filmes à memória de seu pai, um militante desaparecido político da ditadura militar, como em “Orlando Bomfim Jr – Desaparecido Político” (2012). Homenageado pelo Festival de Cinema de Vitória em 2014, ele é reconhecido como um dos símbolos do audiovisual capixaba por priorizar a cultura popular e entender sua importância na formação da sociedade, falecendo aos 80 anos no Rio de Janeiro, vítima de pneumonia.
As sessões recentes já mostraram a força do projeto. A estreia, com Tutti Tutti Buona Gente, Propriamente Buona, discutiu como a imigração italiana influenciou sotaques, modos e pratos capixabas. Depois, O Bondinho de Santa Teresa reacendeu debates sobre o Centro de Vitória e suas transformações. Em seguida, Dos Reis Magos Tupiniquins trouxe ao centro da conversa a presença indígena na formação do estado. Cada encontro lotou o espaço e gerou discussões que se estenderam pelas mesas dos bares da Praça Oito, como todo bom debate capixaba deveria fazer.
A programação de agora mantém o fôlego: Linhas Paralelas, de Orlando Bomfim, apresenta a narrativa de Neusa, que revisita suas memórias entre viagens de trem. Já A Última Sala, de Gabriela Busato e Júlio Cesar, investiga a decadência dos antigos cinemas de rua de Vitória, restando apenas o resistente CinErótico como testemunha de um passado pulsante. Juntos, os filmes formam um mergulho na memória afetiva e urbana da capital.
Mais que exibir obras, o cineclube devolve ao Centro uma vocação histórica: ser palco de debate, cultura e encontro. Em tempos de telas individuais, ver filmes coletivamente na Praça Costa Pereira é quase um ato político. E, no Triplex Vermelho, política e arte sempre caminham juntas — de preferência, lado a lado, rumo a uma cidade que não tem medo de se olhar no próprio reflexo.
CINECLUBE ORLANDO BOMFIM
📆 25/11
🕐 19h
📌 Triplex Vermelho Praça Costa Pereira
“Linhas Paralelas” – Direção: Orlando Bomfim
“A Última Sala” – Direção: Gabriela Busato e Júlio Cesar
