Na quinta-feira (9), Israel e o Hamas firmaram um cessar-fogo que põe fim a dois anos de bombardeios e escassez na Faixa de Gaza, onde mais de 67 mil palestinos foram mortos.
O acordo, intermediado pelo Catar, Egito, Turquia e Estados Unidos, prevê a libertação de reféns israelenses em troca de cerca de dois mil prisioneiros palestinos, além da entrada imediata de comboios com alimentos e medicamentos.
A assinatura ocorreu em Sharm el-Sheikh, no Egito, após semanas de negociações indiretas entre as partes.
Segundo o texto do pacto, as forças israelenses deverão iniciar uma retirada parcial do território e suspender as ações militares enquanto o Hamas libera os reféns mantidos desde os ataques de outubro de 2023.
Autoridades que participaram das tratativas informaram que a trégua só passará a vigorar após a ratificação pelo gabinete israelense, prevista ainda para esta quinta-feira.
Em Gaza, a população celebrou o fim dos ataques e a expectativa de que caminhões de ajuda humanitária finalmente atravessem a fronteira. Em Tel Aviv, famílias dos reféns reuniram-se na Praça dos Reféns, entre lágrimas e alívio, após dois anos de mobilizações.
Um morador de Khan Younis, no sul do enclave, disse que a população comemorava o fim do derramamento de sangue e que toda a Faixa de Gaza estava em festa.
Permanece, contudo, um grau de incerteza: a lista dos prisioneiros palestinos a ser liberada ainda não foi finalizada e o destino de dezenas de reféns segue indefinido.
Também não existe consenso sobre o futuro político de Gaza nem sobre qual será o papel do Hamas na administração do território; por enquanto, o acordo representa apenas o primeiro passo de uma negociação delicada que depende de garantias externas.
Trump busca ganho político enquanto os Estados Unidos seguem vinculados à crise
Donald Trump apresentou o anúncio do cessar-fogo como uma vitória pessoal e descreveu o momento como um “grande dia para o mundo”, mas o desfecho em Gaza não apaga o envolvimento dos Estados Unidos no conflito.
Desde o início da guerra, Washington forneceu armamentos, ofereceu cobertura diplomática e exerceu veto sistemático a resoluções da ONU que pediam o fim dos ataques e a proteção de civis.
Mesmo após a escalada que destruiu bairros inteiros e provocou a morte de milhares de crianças, o governo norte-americano manteve o apoio militar a Israel, consolidando-se como o principal respaldo político de Benjamin Netanyahu.
Com a justificativa de combater o “terrorismo”, os EUA legitimaram uma ofensiva apontada por organismos internacionais como genocídio e frustraram iniciativas de investigação no Tribunal Penal Internacional.
Agora, Trump procura transformar o cessar-fogo em capital político, projetando-se como mediador de paz em um conflito cujo apoio e cuja perpetuação foram favorecidos pelas ações de seu país.
O acordo, que prevê a troca de reféns por prisioneiros, surge dois anos e um dia após os ataques de 7 de outubro de 2023, data que Trump tem usado como símbolo de seu retorno à cena internacional.
No entanto, qualquer retórica pacificadora não elimina o fato de que os Estados Unidos financiaram as armas, protegeram a impunidade de Israel e contribuíram para o isolamento da Palestina nas instâncias multilaterais.
Ao se apresentar como “pacificador”, Trump convive com a contradição de ter transformado em alvos de sanções e críticas juízes e procuradores do TPI que investigavam crimes de guerra em Gaza. Essa postura de hostilidade às instituições internacionais facilitou a extensão do conflito e agravou a catástrofe humanitária que agora tenta capitalizar.
Alívio humanitário imediato, mas sem absolvição
O cessar-fogo oferece um alívio imediato a uma população arrasada por dois anos de ataques, fome e deslocamentos forçados.
Milhares de famílias que viviam em tendas aguardam a chegada de caminhões com alimentos e insumos médicos. O acordo prevê que o fluxo de ajuda seja supervisionado por países mediadores e que as tropas israelenses recuem para uma linha previamente acordada, o que deve abrir espaço para a reconstrução e a retomada de serviços básicos.
A libertação dos reféns israelenses e dos prisioneiros palestinos é componente central da trégua, mas o pacto não resolve as causas estruturais do confronto.
A Faixa de Gaza segue sob bloqueio e Israel mantém controle militar e econômico sobre o território. A reconstrução dependerá da atuação eficaz de organizações humanitárias e do compromisso da comunidade internacional em impedir novas violações.








