Entre os vários temas sensíveis dos cuidados paliativos, destaca-se um dos mais enigmáticos: o fenômeno denominado “melhora da morte”, também conhecido tecnicamente como lucidez terminal.
Descrito por equipes de saúde, pacientes e familiares, manifesta-se em um momento específico: horas ou dias antes do óbito, quando, de forma inesperada, pessoas em fase terminal apresentam uma curta recuperação da consciência, da energia e da capacidade de interação com o ambiente.
Embora seja documentada, essa ocorrência segue gerando controvérsias na prática clínica, na ética médica e nas relações com a família. O que, afinal, se conhece sobre esse quadro?
Características da fase final da vida
A fase final da vida caracteriza-se por uma doença avançada e irreversível, como demências em estágio terminal ou câncer metastático. Nessa etapa, a evolução leva a um quadro em que a morte é considerada iminente: em dias ou semanas.
Nesse cenário, os cuidados passam a priorizar exclusivamente o conforto do paciente e o alívio dos sintomas, com ênfase nos cuidados paliativos e no suporte emocional à família. Entre os sinais mais comuns estão:
- Fraqueza intensa;
- Redução da ingestão alimentar;
- Alterações do estado mental;
- Respiração irregular;
- Diminuição da interação com o ambiente.
O fenômeno conhecido como “melhora da morte”
Mesmo com a progressão do quadro, médicos e parentes podem observar uma melhora súbita e inexplicável da consciência do paciente, frequentemente após longo período de estupor ou coma.
Essa melhora, geralmente espontânea e de curta duração, surge sem intervenção clínica específica e costuma provocar forte impacto entre os familiares, que muitas vezes interpretam o episódio como sinal de recuperação.
Os sinais relatados nesse fenômeno incluem:
- Aumento de energia para dialogar com familiares;
- Retorno do apetite ou aceitação de alimentos;
- Alívio da dor sem alterações importantes na medicação;
- Elevação do nível de consciência, com maior lucidez.
Entretanto, esses episódios não seguem um padrão estabelecido. Sua ocorrência e intensidade variam conforme a doença, o tratamento em curso e a resposta individual do organismo.
O que a ciência sabe até o momento
Embora pouco investigada, a lucidez terminal aparece na literatura científica e é reconhecida por equipes de cuidados paliativos como um possível aspecto do processo de morrer. As principais hipóteses são:
- Alterações fisiológicas: a liberação de neurotransmissores como adrenalina e endorfinas pode produzir sensação de bem-estar, alívio da dor e maior energia;
- Flutuações metabólicas: variações nos níveis de oxigênio e na circulação sanguínea que afetam temporariamente a função cerebral;
- Reação emocional e social: o organismo pode mobilizar um “esforço final” para permitir interações de despedida e resolução emocional.
Por ser imprevisível e de difícil estudo em ambiente controlado, o fenômeno permanece cercado de incertezas. Há falta de estudos clínicos robustos que confirmem sua frequência ou expliquem seus mecanismos de forma conclusiva.
Impacto emocional, cultural e espiritual
Mesmo com lacunas no conhecimento científico, a melhora da morte tem forte valor simbólico e emocional. Muitas famílias encaram esse momento como oportunidade de despedida, ajuste de contas ou manifestação espiritual. Diferentes tradições religiosas oferecem interpretações que reforçam essa percepção:
- Cristianismo: a morte é vista como passagem para a vida eterna, e a lucidez final é percebida como momento de reconciliação e graça;
- Islamismo: a clareza mental antes da morte é entendida como dom de Allah para permitir despedidas e mensagens finais;
- Budismo: sem a noção de ego eterno, esse estado de consciência pode ser uma oportunidade espiritual rumo ao nirvana;
- Espiritismo: a morte é uma transição e, conforme obras de Allan Kardec, a lucidez pode ser favorecida por presenças espirituais que trazem serenidade e compreensão.
Dignidade até o fim da vida
A medicina reconhece que o processo de morrer não é linear. Oscilações nos sinais vitais e no estado geral são esperadas e podem gerar a impressão equivocada de recuperação.
Nessas circunstâncias, o cuidado deve priorizar a presença da família, o conforto, o silêncio, a oração, e possibilitar que a pessoa parta em paz.
Conclusão
A “melhora da morte” segue como um fenômeno envolto em mistério. Apesar de vários relatos de profissionais e familiares, não existem evidências científicas consistentes que expliquem por que ocorre, nem há garantia de que se repita em todos os casos.
O término da vida constitui uma experiência complexa, influenciada por fatores biológicos, emocionais, culturais e espirituais. Por isso, reconhecer e acolher manifestações como essa, com empatia e clareza, integra o compromisso dos cuidados paliativos: preservar a dignidade e o conforto até os últimos instantes.








