“Doutor, agora eu tenho um psicólogo que me atende 24 horas por dia e ainda por cima é de graça.” Foi assim que Amanda (nome fictício) me recebeu na última sessão, exibindo seu celular como quem mostra um troféu. Ela acabara de descobrir o ChatGPT e estava eufórica, finalmente tinha encontrado alguém que “realmente a entendia”.
Como Amanda, milhões de brasileiros estão derramando suas angústias mais profundas para inteligência artificial. Lembra daqueles filmes onde as máquinas dominam o mundo? Não precisavam de lasers ou robôs assassinos. Bastou oferecer algo que nossa sociedade desesperadamente deseja, alguém que nunca nos julga, nunca nos contraria, nunca nos desafia. Se você também já pensou nisso, ou já está fazendo isso, precisa saber o que descobri no meu consultório.
O caso que me fez repensar tudo
Amanda chegou ao meu consultório destruída por um relacionamento que qualquer pessoa classificaria como tóxico em dois minutos. Três anos sofrendo com um namorado que desaparecia por dias, a tratava com indiferença, demonstrava total desinteresse emocional. Nas nossas sessões, eu tentava mostrar os padrões destrutivos dessa relação, mas ela resistia com unhas e dentes.
Antes do ChatGPT, Amanda buscava confirmação no tarô, na numerologia, nas cartas ciganas, qualquer oráculo que sussurrasse o que ela queria ouvir. Então descobriu uma ferramenta muito mais sofisticada que ofereceu “análise psicológica” baseada apenas na versão editada que ela apresentou, omitindo os xingamentos e enfatizando os raros momentos bons.
Por que trocamos humanos por algoritmos?
A resposta é mais perturbadora do que parece, as IAs nos oferecem exatamente aquilo que queremos ouvir, quando queremos ouvir. Elas nunca questionam nossa versão dos fatos, nunca sugerem que talvez também tenhamos responsabilidade, nunca apontam nossos padrões autodestrutivos. É como conversar com um amigo que sempre, inevitavelmente, toma nosso lado.
Mas aqui está a verdade inconveniente, a transformação psicológica não acontece na zona de conforto. É como ir ao cardiologista preocupado com dores no peito e ele só te oferecer palavras tranquilizadoras sem investigar o que realmente está acontecendo.
O que se perde na troca
Um terapeuta humano te mostra não apenas quem você pensa que é, mas quem você realmente está sendo. As IAs só conseguem trabalhar com a versão editada que você apresenta, todos nós editamos nossas histórias quando estamos em negação. “Você reparou que sempre coloca a culpa nos outros?” Essa pergunta, vinda de alguém que genuinamente se importa, pode transformar sua vida.
Quando você se abre completamente com outro ser humano e percebe que ele genuinamente se importa com sua dor, isso é cura. É ser visto, compreendido, acolhido em sua humanidade imperfeita, contraditória, bagunçada. ChatGPT, Gemini, Claude, nenhuma IA oferece essa conexão real.
Sinais de que você pode estar na armadilha
Fique atento se você está desenvolvendo resistência crescente a opiniões contrárias, dependência do “terapeuta digital” para qualquer probleminha, linguagem emocional empobrecida ou se relacionamentos reais estão ficando “difíceis” comparados à IA sempre disponível e complacente.
Dois meses depois da descoberta do ChatGPT, Amanda começou a faltar às sessões. O relacionamento tóxico que a trouxe ao consultório? Continua exatamente igual, mas agora ela tem “explicações científicas” para justificar por que deve permanecer nele. O ChatGPT não curou Amanda. Cristalizou o problema dela.
Quando a IA realmente pode ajudar
Não sou tecnófobo. Reconheço que ferramentas como ChatGPT têm seu valor, informação básica sobre transtornos mentais, apoio emergencial quando um profissional não está disponível, complemento ao tratamento real. Mas jamais como substituto para o encontro humano genuíno que a cura real exige.
A verdade é que nenhum algoritmo vai te contar, você não precisa de mais confirmação, você precisa de mais honestidade. Precisa de alguém que tenha coragem de te amar o suficiente para te incomodar quando necessário, que aponte seus pontos cegos, que te desafie a crescer além das suas narrativas confortáveis.
E você?
Amanda continua presa no mesmo relacionamento, conversando diariamente com o ChatGPT, acreditando que está sendo “ajudada”. E você? Vai escolher o conforto artificial ou a transformação real?
Ser humano não é sobre encontrar a máquina perfeita que nos compreenda. É sobre encontrar outros humanos imperfeitos que, mesmo assim, escolhem caminhar conosco rumo a uma versão melhor de nós mesmos. E isso, nenhum algoritmo, por mais sofisticado que seja, jamais poderá fazer por você.
Faço atendimento presencial em Maceió/Al e online a brasileiros de todo o mundo. Acredito que a cura acontece no encontro entre duas humanidades imperfeitas e que essa imperfeição é exatamente o que nos torna capazes de crescer.










sempre assertivo em seus textos 👏🏻👏🏻👏🏻
parabéns, Thiago pelo seu lindo trabalho , tenho acompanha do voce . abençoe e sucesso pra voce e sua equipe.
Ótimo texto, uma realidade vivida atualmente com a IA, mas precisamos ver a importância da psicoterapia como um grande ferramenta para nosso desenvolvimento pessoal.
Excelente texto e reflexão, Thiago!
É como se fosse criada com alguém sempre passando a Mão na Cabeça . Um falso ” Amigo “
parabéns 👏 Thiago pelo seu trabalho nata 10 recomendo a todos
um tema muito pertinente! tenho amizades que usam o chatgpt dessa forma e vejo que a cristalização dos problemas é algo REAL e notavel para quem acompanha as narrativas atrves da realidade! muito obrigada pela contribuição!!
É preciso coragem para dizer verdades desconfortáveis; é preciso segurança para desafiar o que está posto como inevitável; é preciso competência para saber discernir e saber como dize-lo. Esse texto diz. E diz de forma clara e objetiva. Gostei;)