A minha experiência com a Igreja Católica começou relativamente tarde. Até os 18 ou 20 anos, não havia tido contato direto com os ensinamentos e tradições católicas. Minha mãe sempre foi da Congregação Cristã do Brasil, uma igreja evangélica, enquanto minha avó paterna era adventista do sétimo dia — embora meu pai não seguisse essa religião. O meu primeiro encontro mais próximo com a doutrina católica aconteceu quando minha família se mudou para o bairro do Ibes, em Vila Velha. Foi lá que iniciei minha participação nos grupos da Renovação Carismática Católica.
Mais tarde, descobri a Pastoral da Juventude e as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), que se tornaram meu grande apoio espiritual e social. Essas comunidades trouxeram um entendimento profundo sobre a imagem de Cristo — não apenas como Salvador e glorioso, mas também como homem, caminhando com seus companheiros e aprendendo durante sua jornada. Foi uma experiência inspiradora e que transformou meu modo de enxergar a religiosidade e o papel da Igreja no mundo.
Outra destas grandes transformações foi acompanhar o conclave que sucedeu a morte de João Paulo II e a eleição de Bento XVI. Mais tarde, quando Francisco assumiu como Papa, senti que ventos de mudança sopravam na Igreja Católica. Ele trouxe uma abordagem mais inclusiva, enfrentando temas que há muito tempo haviam sido negligenciados ou colocados “debaixo do tapete”, como os abusos sexuais cometidos por membros da Igreja, questões de corrupção dentro do Banco do Vaticano, a aceitação da comunidade LGBTQIA+ e dos divorciados no espaço religioso. Para mim, ele representou um verdadeiro mediador, alguém que não hesitou em enfrentar as “empoeiradas estruturas” da Igreja e se colocar ao lado dos mais vulneráveis.
Francisco trouxe à tona a ideia de uma Igreja inserida no mundo e comprometida com a mudança social. Ele mostrou que, apesar de sagrada, a instituição também é composta por seres humanos, e que esses seres humanos, inevitavelmente, têm suas falhas. Era reconfortante e inspirador saber que ele estava à frente — um Papa que escolheu ser dos pobres, das mulheres e dos excluídos.
Porém, sua morte, no domingo de Páscoa, foi um verdadeiro golpe de tristeza. Perdemos um líder, um visionário, alguém que, com sua mediação e sensibilidade, conseguiu transformar os seguidores da fé e inspirar um movimento positivo dentro da Igreja. Além da dor, surgiu também o medo sobre o futuro que viria com o próximo Papa: seria capaz de continuar o trabalho de Francisco ou retrocederia às posturas conservadoras tão arraigadas no passado?
A escolha do novo Papa, o americano Leão XIV, trouxe alívio. Seu nome remete ao Papa Leão XIII, um líder conhecido por sua abordagem progressista, que muito contribuiu para o papel social da Igreja. Apesar de um receio inicial diante de associações políticas internacionais, especialmente por conta de figuras polêmicas como Donald Trump, a confirmação de Leão XIV como líder trouxe esperança. Sua formação agostiniana sugere que ele continuará a trilhar o caminho fortalecido por Francisco, com uma opção preferencial pelos pobres e vulneráveis, e por mudanças estruturais importantes.
Que Leão XIV possa, assim como Francisco, inspirar mais de um bilhão de católicos a refletirem sobre sua própria fé e sobre o mundo em que vivem, trazendo de volta o verdadeiro Jesus de Nazaré — aquele que caminhou entre nós, aquele que enfrentou os desafios de seu tempo e que se tornou símbolo de humanidade, justiça e compaixão. Esse é o desafio de uma Igreja que busca ser realmente transformadora e parceira ativa na construção de um mundo melhor.