O fascínio pela fama remonta às origens do cinema. Com o advento das redes sociais, esse ideal ficou mais acessível e também mais arriscado. Com Klara Castanho e Karine Teles à frente do elenco, surge #SalveRosa, um suspense nacional que lança um pedido de socorro diante da exploração do entretenimento infantil — um segmento em expansão na mídia que começa a alertar para os danos sofridos por jovens estrelas online.
De que trata #SalveRosa?
Assinado por Susanna Lira, diretora vencedora do Festival do Rio com Torre das Donzelas, o filme acompanha a relação entre mãe e filha: Dora (Karine Teles) e Rosa (Klara Castanho). Rosa, uma garota de 13 anos, é uma estrela juvenil da internet, seguida por milhões nas plataformas digitais.
Na vida privada, Rosa é reservada e vive sob o controle constante da mãe, que também atua como sua empresária. Quando ambas se mudam para um condomínio de alto padrão no Rio de Janeiro, passam a conviver com os vizinhos Beto (Ricardo Teodoro), Vera (Indira Nascimento) e a filha deles, Luana (Alana Cabral).
À medida que a trama avança, Rosa desvenda segredos sobre sua trajetória, enquanto Dora faz de tudo para preservar o estilo de vida luxuoso que alcançou, mesmo que isso ocorra às custas da própria filha. Embora não seja inspirado em fatos reais, #SalveRosa se apoia na explosão dos influenciadores mirins dos últimos anos e aborda preocupações crescentes do setor, além de explorar temas como maternidade narcisista, idealização da família e traição.
#SalveRosa tem coragem de dizer o que ninguém quer ouvir
No geral, o filme não prima pela sutileza, para o bem e para o mal. A estética do longa remete à artificialidade dos vídeos de Rosa, com paletas vibrantes e personagens de traços simplificados: o benevolente é totalmente bom; o malvado, totalmente mau. Essa abordagem dificulta a empatia com as figuras na tela, mesmo quando os acontecimentos extremos do suspense poderiam ocorrer na vida real, afinal a realidade frequentemente supera a ficção.
Apesar do tom por vezes caricatural, trata-se de uma obra que não lhe falta ousadia. Em determinada sequência no banheiro, quando Rosa faz uma descoberta chocante, a cena impressiona pela violência da revelação e levou espectadores a desviar o olhar. Isso comprova que o filme se apresenta como suspense, não como mero drama familiar para exibição vespertina.
Em especial, o desfecho demonstra a audácia da proposta. Os minutos finais, assim como os recursos sonoros que os acompanham, provocaram as reações mais francas da plateia, traduzindo a urgência da mensagem do filme. Caso fosse disponibilizado em uma plataforma como a Netflix, é provável que virasse assunto de destaque nas redes sociais do país.
Karine Teles e Klara Castanho vivem uma novela de 90 minutos em #SalveRosa
A história é conduzida pelas personagens Rosa e Dora. Na pele da matriarca, Karine Teles entrega mais uma interpretação marcante, embora o roteiro a coloque como a principal antagonista da narrativa. Dora age sem princípios aparentes; por trás de suas demonstrações de afeto com a filha existe uma forte manipulação, movida por ambição e prazer.
O texto assinado por Ângela Hirata Fabri e concebido por Mara Lobão (parceiras na franquia Um Ano Inesquecível) aposta em hipérboles para deixar claro que explorar os próprios filhos é atitude de vilão. Talvez um retrato mais humano de Dora, que pudesse acreditar, por exemplo, estar fazendo sinceramente o melhor para a filha, tornasse a personagem mais complexa. Na versão atual, Dora poderia ser uma possível amiga de Nazaré Tedesco, porém sem o carisma daquela antagonista televisiva.
A escolha de Klara Castanho para interpretar Rosa pode surpreender à primeira vista, já que a atriz tinha cerca de dez anos a mais do que a personagem durante as filmagens; ainda assim, a opção mostra-se acertada. Pela caracterização infantil deliberadamente exagerada imposta por Dora, Klara convincentemente aparenta ser mais jovem (sem remeter a casos extremos como A Órfã 2) e transmite bem a ingenuidade dessa fase, mesmo com diálogos contidos. Sua presença dialoga de forma eficaz com a premissa e o tom de #SalveRosa.
A exploração dos jovens online é uma questão preocupante
Abordar um tema tão atual sem a distância temporal desejável para análise profunda é, por si só, um desafio. Ainda assim, o debate sobre influenciadores mirins é necessário, pois a internet funciona como uma comunidade amplamente sem regras. Se há tanta dificuldade para remover conteúdos criminosos online, imagina-se a ausência de regulamentação específica para proteger crianças e adolescentes que atuam como influenciadores.
Parece que a sociedade tomou um caminho mais largo que a perna e agora corre para reparar os danos gerados. A opção de Susanna Lira por tratar o tema em tom de ficção, apesar da sua experiência com documentários, é curiosa; sob a camada de artificialidade e simplicidade de #SalveRosa pulsa uma mensagem de socorro contundente. O uso de exageros funciona como forma de delinear com clareza a problemática, na esperança de que, dessa forma, algo possa ser aprendido.
Ainda assim, haveria espaço para maior naturalidade e sutileza na maneira de expor a questão. Compreende-se que a internet seja uma selva implacável, mas existe demanda por mais humanidade no cinema. O final do filme confirma a coragem de Susanna Lira e de sua equipe; a intenção inicial de empregar um palavrão para enfatizar essa ousadia foi substituída pela palavra “coragem”.
Há também um comentário irônico sobre a liberdade de grafar a hashtag sem se preocupar com o espaço antes da pontuação, exemplificado ao escrever ‘obrigada #SalveRosa.’ e notar o ponto final colado à tag.








