O desejo sexual não se origina apenas de fatores físicos; ele é permeado por emoções, vivências e pela forma como a rotina é administrada. Compreender como o aspecto emocional influencia a libido é fundamental: quando o estresse aumenta, a ansiedade surge ou a autoestima fica fragilizada, o apetite sexual costuma ser uma das primeiras funções a sofrer as consequências.
A psiquiatra e sexóloga Carmita Abdo, professora da USP e coordenadora do programa de estudos em sexualidade do Hospital das Clínicas de São Paulo, observa que o estresse é a base da exaustão física e mental, podendo provocar doenças, inclusive depressão. Em estados de depressão ou esgotamento, a pessoa tende a perder o interesse por relações, assim como deixa de ter outras motivações do dia a dia.
O médico nutrólogo e membro do conselho da Herbalife, Nataniel Viuniski, acrescenta que a ansiedade também tem papel importante: o cortisol, hormônio liberado em situações estressantes, quando permanece elevado prejudica a produção de testosterona e estrogênio, além de alterar o humor e dificultar o relaxamento necessário para uma vida sexual satisfatória.
Autoestima e desejo sexual
Pode parecer óbvio, mas a autoconfiança e a autoestima são fatores decisivos para o desejo. Quando esses aspectos estão fragilizados, tanto homens quanto mulheres podem enfrentar problemas de desempenho, como dificuldades de ereção, falta de excitação ou problemas de lubrificação. Segundo Carmita, esse quadro gera frustrações repetidas que corroem o interesse sexual, e a ausência de desejo pode funcionar como um mecanismo inconsciente para evitar novas falhas.
Nataniel destaca que a percepção que se tem de si próprio interfere diretamente na intimidade. Se a pessoa não se sente atraente ou segura, tende a não se entregar ao momento sexual; o pensamento crítico retira a presença, transformando a relação em fonte de tensão em vez de prazer.
Embora afetem ambos os sexos, homens e mulheres costumam reagir de modos distintos. O homem frequentemente insiste na atividade sexual mesmo sem desejo, comportamento que pode resultar em falhas de ereção ou ejaculação precoce, muitas vezes vinculadas à ansiedade.
Por sua vez, muitas mulheres passam a evitar o contato íntimo, mostram indisponibilidade ou sentem dor durante a relação devido à falta de excitação e lubrificação. Essas dificuldades não decorrem de escolha voluntária, mas sim de questões emocionais ou físicas, completa a especialista.
“Homens continuam sendo muito pressionados por desempenho e potência, enquanto mulheres lidam com expectativas sobre disponibilidade e aparência; essas cobranças externas aumentam a ansiedade e prejudicam a intimidade.”
Impacto das vivências anteriores
O aspecto emocional também afeta a libido por meio de recordações dolorosas. Traumas, como abuso ou vivências sexuais negativas, deixam marcas que associam o sexo à dor, à culpa ou à sensação de inadequação, comprometendo a intimidade mesmo em relacionamentos atuais saudáveis, aponta Carmita.
Segundo a psicóloga Katherine Sorroche, a libido não é uma função isolada do corpo, sendo atravessada pela trajetória pessoal. Traumas emocionais, especialmente os que envolvem violação de limites, abandono, rejeição ou experiências negativas com o próprio corpo, ficam presos na memória emocional. Esses registros moldam a forma como a mulher se relaciona com o toque, com a intimidade e até com o direito ao prazer.
“Sem que a pessoa perceba, o inconsciente pode ativar defesas que evitam situações associadas ao trauma. Por isso, a falta de desejo muitas vezes não tem relação com o parceiro atual, mas com vivências anteriores.”
“A resposta sexual feminina está profundamente ligada ao emocional. Estados como estresse, ansiedade, medo ou tristeza podem disparar o sistema de alerta do corpo, que por sua vez inibe o mecanismo de excitação; o prazer exige justamente o oposto: presença, entrega e relaxamento”, esclarece Katherine.
Como o emocional influencia diretamente o desejo, cuidar da saúde física e mental torna-se essencial. Hábitos que favorecem o bem-estar corporal e psicológico, como alimentação equilibrada, sono adequado, prática regular de atividades físicas e estratégias para manejar o estresse, contribuem também para uma vida sexual mais satisfatória, reforça Carmita.
A psicóloga ressalta que o processo envolve ressignificar sentimentos difíceis. Sentimentos como culpa, frustração ou vergonha diante da diminuição do desejo são frequentes, mas o primeiro passo é reconhecer que o desejo é cíclico, sensível e responde ao contexto interno e externo.
Além disso, a comunicação entre parceiros faz diferença: casais que dialogam sobre preferências, desconfortos e dificuldades tendem a estabelecer relações mais íntimas e gratificantes, afirma a sexóloga.
Transições de vida e sexualidade
Etapas naturais da vida, como maternidade, paternidade, envelhecimento ou mudanças profissionais, podem alterar temporariamente o desejo sexual. Isso não significa o fim da vida íntima; o importante é respeitar os limites de cada fase e procurar suporte quando necessário, orienta a sexóloga.
Para o nutrólogo, essas transformações também possibilitam novas formas de conexão: quando o casal compreende que a sexualidade vai além do ato sexual, englobando afeto, intimidade e cuidado, o casal encontra maneiras alternativas de manter a proximidade mesmo em momentos de baixa libido.
“Sentir-se vista, acolhida e respeitada favorece a abertura para o desejo; de modo inverso, onde há desconexão emocional e ressentimentos acumulados, o desejo tende a esfriar.”
Mesmo com bom estado físico, o aspecto emocional pode afetar fortemente a libido. Quando há bloqueios emocionais específicos relacionados à sexualidade, isso indica que a libido pode estar sendo mais influenciada pelo psicológico do que pelo corpo.
É preciso lembrar que a variação do desejo é normal, mas merece atenção se persistir. Períodos de estresse, luto ou cansaço intenso reduzem o apetite sexual; contudo, quando a ausência de libido se prolonga e começa a impactar a autoestima, a identidade ou o relacionamento, trata-se de um sinal de que questões mais profundas precisam ser investigadas, conclui a psicóloga.









