Quero trazer uma reflexão muito importante e que fala sobre empoderamento, inclusão e igualdade: o movimento de mulheres negras sempre repete uma frase emblemática – nossos passos vêm de longe. O caminho que nos trouxe até aqui, sejam mulheres negras ou brancas, cada uma com suas experiências e desafios, foi pavimentado por lutas, resistências e conquistas históricas.
Recentemente, me provocaram sobre uma lei promulgada em 2022, que finalmente garantiu às mulheres o direito de decidir sobre a laqueadura, sem a necessidade da autorização do marido ou companheiro. Até parece absurdo que, em pleno século XXI, uma mulher ainda precisasse da anuência de um homem para escolher sobre o próprio corpo. O direito de decidir sobre nossa própria vida deveria ser inquestionável. Mas, até pouco tempo atrás, era assim: a autonomia da mulher, até para decidir se queria ter filhos ou não, era limitada.
Esse questionamento me fez lembrar de um encontro com outras mulheres, onde reconstruímos nossa linha do tempo de conquistas. Em 1962, tivemos o Estatuto da Mulher Casada, que permitiu a mulheres se verem livres de maridos que já não faziam sentido em suas vidas, por diversos motivos, como falta de afeto ou abuso. Em 1974, só então conseguimos o direito de ter um cartão de crédito. E, em 1977, mais de uma década depois, chegou o direito ao divórcio. São marcos fundamentais, mas que revelam como os direitos mais básicos nos foram negados e precisaram ser escritos em lei para terem validade.
Sempre me questionei: se nascer com dignidade, respeito, direito à escolha e aos nossos corpos faz parte do que é ser humano, por que precisamos de leis para garantir o que já deveria ser nosso? Na academia, discutíamos muito sobre justnaturalismo e justpositivismo, tentando entender por que o direito à vida e ao corpo precisa ser formalizado por lei. E vejo que, mesmo em 2025, ainda precisamos dessas garantias, porque a sociedade insiste em limitar o que deveria ser natural: nossa autonomia.
A luta das mulheres, especialmente das mulheres negras, é marcada pelo empoderamento e pelo enfrentamento das barreiras impostas não apenas pelo machismo, mas também pelo racismo. Mesmo assim, somos nós quem mais carregamos as consequências de uma gravidez não planejada, de escolhas feitas sem o devido acesso à informação e ao respeito. O direito de dizer sim ou não sobre o nosso corpo, sobre a maternidade, é nosso. Mas também é responsabilidade nossa decidir quando, como e se queremos trilhar esse caminho. Porque, no final das contas, somos nós, casadas ou solteiras, jovens ou maduras, que sentimos os impactos diretamente em nossas vidas, nos estudos, no trabalho, na liberdade de ir e vir.
Ser mãe é, sem dúvida, um milagre – mas é também um compromisso profundo. Por isso, mesmo que tardiamente, celebro a conquista da laqueadura sem anuência masculina. Essa lei é mais que um direito: é um símbolo de equidade de gênero, inclusão e liberdade. Ela representa também uma chamada à reflexão para todas nós – adolescentes, jovens e mulheres aos 50 anos –, para que usemos essa autonomia com responsabilidade, fazendo escolhas conscientes e respeitando nossos próprios limites.
Que possamos aproveitar, gozar e viver nossos corpos plenamente, mas sempre lembrando que nossas decisões influenciam não só o nosso presente, mas o futuro de quem pode vir depois de nós. Nossos passos vêm de longe, e cada conquista é resultado de um longo caminho de luta. Que sigamos firmes, refletindo, avançando, empoderando e inspirando outras mulheres a trilhar, com orgulho e consciência, a sua própria jornada.









