A cada visita ao Instagram, é possível observar uma infinidade de vidas aparentemente perfeitas. Pessoas viajando, sorrindo, exibindo relacionamentos, conquistas profissionais, casas impecáveis, corpos esculpidos e famílias felizes. Manter-se firme e evitar comparações pode ser um desafio. Muitas vezes, esquecemos de considerar o que acontece nos bastidores dessas narrativas, acreditando que a realidade alheia é superior à nossa. A comparação nas redes sociais se torna uma batalha perdida, gerando desconforto.
A busca pela originalidade
Se todos buscam construir imagens e vidas semelhantes às dos outros, onde fica o espaço para a originalidade? Como descobrir e explorar nossas singularidades se nossos referenciais estão externos? Essas questões foram levantadas para Patrícia Cotton, especialista em inovação e liderança criativa, fundadora da Upside Down Thinking, projeto dedicado a transformar sistemas desgastados.
Patrícia estuda a originalidade em uma era dominada por algoritmos. Com uma visão crítica sobre comportamentos padronizados, ela participou do Clube de Leitura de Vida Simples em julho. Curiosamente, ela não possui perfis em redes sociais, o que lhe permite analisar o universo digital com um olhar externo.
Segundo ela, a tendência de comparação nas redes sociais é um comportamento enraizado em nossa evolução e intensificado pela vida digital. Apesar disso, existem formas de recuperar a individualidade e superar comparações que prejudicam a autoestima.
A comparação e o pertencimento
“É possível parar de nos comparar? Minha resposta até agora é não”, admitiu Patrícia, revelando que também lida com esse hábito, incluindo comparações entre suas próprias versões passadas, presentes e futuras.
Ela argumenta que a comparação não é necessariamente ruim; desde o nascimento, dependemos de espelhos sociais para nos entendermos. Como seres biopsicossociais e gregários, temos uma necessidade profunda de pertencer a um grupo.
Seja nas redes sociais, na vizinhança ou em comunidades, “precisamos estar na tribo para sobreviver”. A comparação ajuda a nos sentir incluídos, amados e seguros emocionalmente.
Essa dinâmica aparece até em narrativas antigas, como a história de Caim e Abel, representando conflitos de inveja e rivalidade – temas recorrentes na história humana.
O desafio da originalidade na era digital
A comparação exacerbada nas redes sociais tornou-se patológica devido à sua constância. A presença incessante de “espelhos digitais” e a atenção reduzida em si mesmo cristalizam esse comportamento, afastando-nos de nossa essência.
Outra preocupação é a forma como a criatividade foi dominada por algoritmos. “A necessidade de pertencimento foi transformada em um produto para sobrevivência digital”. Muitos ajustam seu comportamento online para evitar julgamentos e buscar aprovação.
Paradoxalmente, isso gera uniformidade. “Quanto mais tentamos nos destacar, mais acabamos parecidos”, observa Patrícia. Isso se reflete em clichês e até na aparência, criando um cenário de “tédio sem fim”.
Um convite para explorar o desconhecido
A própria jornada de Patrícia oferece uma alternativa. Cansada da exaustão e das comparações, ela decidiu passar um ano sem celular. Esse período, que considera o mais produtivo e criativo de sua vida, permitiu que conhecesse seu marido, escrevesse uma tese, criasse um negócio e se mudasse para Berlim.
Durante esse tempo, ela acessou o que chama de “desconhecido desconhecido” – um espaço onde descobriu potenciais ocultos. Enquanto o “conhecido conhecido” e o “desconhecido conhecido” dominam nossa atenção, esse terceiro espaço revela possibilidades inexploradas.
Os quatro pilares da originalidade
Sentido de origem: Conexão profunda com raízes pessoais e contexto histórico.
“Nossa originalidade é inerente, evidenciada por nossa voz, DNA e impressões digitais únicas. Isso torna a comparação ilógica. A beleza está na diversidade de singularidades.”
Vocação: Uma chamada interna para expressar talentos.
Expressão: Exteriorizar nossa realidade única, criando valor pessoal e profissional.
Autoria: Construir autoridade por meio da autenticidade.
“Nesse estado de integridade, as comparações prejudiciais perdem sentido.”
As cinco dimensões da originalidade
Patrícia identificou cinco traços que compõem a originalidade: autenticidade, pioneirismo, criatividade, simplicidade e coragem. Essas qualidades se combinam de forma única em cada pessoa, e reconhecer isso permite valorizar a própria essência.
“Elas iluminam quem somos e quem nunca seremos, ajudando a aceitar a nós e aos outros como são.”
O poder do discernimento
Saber dizer “não” é essencial para alinhar decisões ao eu autêntico. “Quando sabemos quem somos, fica claro o que não queremos”, explica Patrícia.
“Através dos ‘nãos bem dados’, encontramos nosso verdadeiro ‘sim’.”
Esse processo elimina influências externas, dificultando comparações. “Só você sabe o que é essencial – não há competição nesse espaço”. Ela recomenda o livro Essencialismo: A Disciplinada Busca por Menos para quem busca aprofundar essa ideia.








