O Vietnã celebra nesta terça-feira (2) os 80 anos da Revolução de Agosto e da declaração de independência com o maior desfile militar em décadas, mobilização popular de dezenas de milhares de pessoas em Hanói e um conjunto de medidas, como a anistia a quase 14 mil presos e a distribuição inédita de recursos à população.
O evento, marcado por forte simbolismo histórico e projeção internacional, também reforçou as oportunidades econômicas do país no cenário global.
Na Praça Ba Dình, onde Ho Chi Minh proclamou em 1945 a independência após quase um século de colonialismo francês e ocupação japonesa, o secretário-geral do Partido Comunista, Tô Lâm, abriu a celebração destacando a continuidade histórica da luta vietnamita.
“Estamos firmes em nosso compromisso de defender a independência, a liberdade, a soberania e a integridade territorial de nossa Pátria, até cada polegada sagrada de terra”, declarou diante de milhares de pessoas.
O dirigente evocou o legado de Ho Chi Minh e reafirmou que os objetivos traçados para 2045 são transformar o Vietnã em uma nação “poderosa, próspera e feliz”.
No discurso, Tô Lâm citou as conquistas desde a Revolução de Agosto — libertação nacional, reunificação e reformas econômicas — como prova de que “não há dificuldades que o povo vietnamita não possa superar”.
A atmosfera foi reforçada pela mobilização popular, com moradores de Hanói lotando as ruas, muitos vestidos de vermelho e com o rosto pintado com a estrela amarela da bandeira.
Uma moradora da capital, Hoang Thi Huyen, 42 anos, acampou dois dias com a família para garantir lugar. “Valeu a pena esperar. As tropas e os caças foram incríveis”, disse à Reuters.
Força militar e solidariedade internacional
A parada militar foi organizada em 87 divisões, entre unidades cerimoniais, infantaria, forças policiais, milícias populares e veículos blindados. A sequência começou com a saudação da força aérea e seguiu com tanques, mísseis, drones nacionais e helicópteros russos Mi-171.
O ápice ocorreu com a passagem dos caças Sukhoi Su-30 sobre o céu de Hanói. Em evento paralelo no mar, submarinos russos da classe Kilo e fragatas participaram da celebração.
Além de exibir a capacidade de defesa, o desfile reforçou laços com aliados históricos. Tropas da China, Rússia, Laos e Camboja marcharam na Praça Ba Đình. Moscou enviou a guarda de honra do Regimento Preobrazhensky, enquanto Laos e Camboja contribuíram com 120 soldados cada.
O presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, acompanhou como convidado de honra.
Líderes nacionais e delegações estrangeiras assistiram à solenidade, incluindo parlamentares chineses e russos. Representando os Estados Unidos, apenas um membro da embaixada esteve presente.
Em comunicado, o secretário de Estado Marco Rubio parabenizou o Vietnã e o descreveu como “um parceiro vital na região do Indo-Pacífico e um líder no enfrentamento de desafios globais comuns”.
Encerrando a programação oficial, o Ministério da Cultura organizou uma apresentação artística com música, teatro e manifestações populares, reafirmando o caráter cultural da celebração. As ruas da capital ficaram tomadas por bandeiras, coreografias e atos cívicos.
Economia em expansão e oportunidades para o Brasil
O aniversário serviu para projetar a imagem de um país que saiu da devastação da guerra para se tornar uma das economias que mais crescem no planeta. O PIB vietnamita saltou de US$8 bilhões em 1986 para US$476,3 bilhões em 2024, multiplicando-se quase 60 vezes.
O PIB per capita, que era de apenas US$80 em 1975, alcançou US$4.700 em 2024. O crescimento médio anual se manteve próximo de 8% nas últimas décadas.
Segundo o economista Elias Jabbour, o processo atual “é o legado revolucionário que se materializa no desenvolvimento acelerado”. Para ele, “a grande referência do Vietnã é o seu processo revolucionário, uma escolha feita lá atrás, e a sua luta até 1976 foi para garantir as condições para esse desenvolvimento”.
Nas relações com o Brasil, os números também são expressivos: a balança comercial chegou a US$7,7 bilhões em 2024, com meta de duplicação até US$15 bilhões em 2030. As exportações brasileiras concentram-se em algodão, milho e soja, mas há expectativa de ampliar para setores como carnes, café, celulose, aço e fertilizantes.
Durante visita a Brasília, em julho deste ano, o primeiro-ministro Pham Minh Chinh e o presidente Lula anunciaram a abertura do mercado vietnamita para a carne bovina brasileira e do mercado brasileiro para a tilápia vietnamita.
Na ocasião, Lula afirmou que “a abertura do mercado vietnamita para a carne bovina brasileira atrairá investimentos de frigoríficos do Brasil para fazer deste país uma plataforma de exportação para o Sudeste asiático”.
Integração internacional e futuro
Hoje, o Vietnã mantém relações diplomáticas com 194 países, parcerias estratégicas com 37 nações e participa ativamente de mais de 70 organismos internacionais. O país é considerado modelo de redução da pobreza — caiu de mais de 60% em 1986 para 1,93% em 2024 — e tem investido em alta tecnologia, educação, saúde e igualdade de gênero.
No discurso em Hanói, Tô Lâm disse que o “objetivo é que, até 2045, o Vietnã se torne uma nação poderosa, próspera e feliz. Essa é a aspiração de toda a nação, um juramento de honra diante da História e do Povo”.
Entre tanques, bandeiras e manifestações culturais, a celebração do 80º aniversário reafirmou o papel do Vietnã como nação que transformou o legado da luta anticolonial em força política, econômica e diplomática. E projetou, ao mesmo tempo, oportunidades concretas para a integração com o Brasil em um contexto de disputa global por mercados e soberania.








