Esta semana foi marcada pelos oitenta anos de dois acontecimentos trágicos na história da humanidade. Trata-se do lançamento das duas bombas atômicas que atingiram as cidades de Hiroshima e Nagasaki no Japão, as únicas empregadas em uma guerra. As duas explosões causaram a morte de milhares de pessoas e contribuíram para a rendição do Japão, o que teve como consequência o fim das últimas batalhas da segunda guerra mundial.
Apesar de muitos considerarem o emprego desses dois artefatos nucleares dispensáveis para o fim do conflito, não se pode negar o seu impacto em diversos aspectos da vida, principalmente o da arte. Hoje vamos lembrar de como essas duas bombas impactaram a música.
Vamos começar por Peace on Earth, composta em 1966 por John Coltrane durante sua turnê por 17 cidades do Japão. Durante sua passagem por Nagasaki, que estava incluída na turnê, Coltrane fez uma visita ao parque em Nagasáqui que é hoje um memorial pelos que morreram naquele dia. O resultado musical desse dia foi Peace on earth.
Peace On Earth (Live At Shinjuku Kosei Nenkin Hall, Tokyo, Japan / July 22, 1966)
Além de John Coltrane o Kraftwerk também escreveu uma canção inspirada na devastação das duas cidades japonesas. Trata-se de Radioactivity, faixa título do quinto álbum de estúdio do grupo Kraftwerk. Lançado em 1975, tanto o álbum quanto a canção Radioactivity não apresentavam claramente qualquer forma de posicionamento da banda sobre o tema armas nucleares. Isso muda em 1991 com o lançamento do álbum The Mix no qual a banda alemão se posiciona de forma explícita contra a exploração de energia nuclear e cita uma série de eventos trágicos envolvendo radioatividade. Dentre eles estão o acidente de Chernobyl e a bomba atômica de Hiroshima, além da inclusão da mensagem “stop radioactivity”, ou, em português, “pare a radioatividade”.
Kraftwerk: Radioactivity (No Nukes 2012, Tokio, Japan)
Dentre as canções que tratam do tema não poderíamos deixar de mencionar a emblemática Rosa de Hiroshima, apresentada no disco de mesmo nome dos Secos e Molhados, em 1973. A letra da música é um poema de Vinicius de Moraes. Nesses versos o Poetinha vê a explosão nuclear como uma rosa inválida e lança mão de sua sensibilidade para criticar o ataque. Coube a Gerson Conrad, membro do Secos & Molhados, a tarefa de transformar o texto em canção e fazê-la ecoar como um grito pacifista.
Secos e Molhados – Rosa de Hiroshima
Além destas, outras canções foram escritas para abordar o clima da Guerra Fria e o medo de que tragédias como as de Hiroshima e Nagasaki se repetissem. Isso aconteceu durante a corrida armamentista entre o Ocidente e a cortina de ferro, encabeçada pela União Soviética e os reflexos desse ambiente surgiram em muitas produções musicais daquele período histórico.
Esse é o ambiente que inspirou David Bowie, por exemplo, a compor a canção Five Years. Nela o músico afirma que “nós temos cinco anos, meu cérebro dói muito / cinco anos, é tudo que temos”. Na opinião de Bowie, era uma questão de tempo até que tragédias nucleares começassem a assolar o mundo todo.
99 red balloons, apesar de parecer uma canção animadinha da década de 1980, é também um protesto contra a guerra e contra o constante medo de um conflito nuclear. Interpretada pela banda alemã Nena, a música fala da brincadeira de dois jovens que soltam balões ao vento e veem seus brinquedos confundidos com discos voadores ou mísseis inimigos, o que provoca uma reação militar de proporções inimagináveis.
NENA | 99 Red Balloons [1984] (Official HD Music Video)
Muitos podem até achar que os músicos vivem em outra dimensão, mas, em momentos como esses, não podemos negar a força que uma canção tem para mostrar a realidade em que vivemos a partir de uma perspectiva diferente.
