O Brasil enfrenta uma das ondas de calor mais intensas de sua história, com temperaturas que superam os 40°C em diversas regiões e sensação térmica que chega a 65°C, próximo ao limite considerado suportável para o ser humano. O fenômeno, que já afeta milhões de pessoas, é um reflexo da crise climática global, que tem batido recordes consecutivos de temperatura. Em janeiro de 2025, o planeta registrou 1,75°C acima dos níveis pré-industriais, segundo o Serviço Copernicus para Mudanças Climáticas da União Europeia. O calor extremo não é apenas um incômodo, mas uma ameaça à saúde, ao trabalho e à vida cotidiana, especialmente para quem depende de atividades ao ar livre.
No Rio Grande do Sul, a onda de calor levou ao adiamento do início do ano letivo, após uma liminar que considerou os riscos à saúde de alunos e professores em escolas sem infraestrutura adequada. A presidente do Sindicato das Professoras(es) e Funcionárias(os) de Escola do RS (CPERS), Rosane Zan, criticou a decisão do governo estadual de retomar as aulas após dois dias, ignorando os alertas científicos sobre as mudanças climáticas. “O estado está na rota de mudanças climáticas severas”, afirmou, destacando a necessidade de investimentos urgentes em infraestrutura escolar.
No Rio de Janeiro, a sensação térmica ultrapassou os 40°C, e a cidade atingiu o nível 4 de calor, o mais alto do protocolo municipal de temperaturas extremas. Moradores como Dona Maria das Flores improvisam soluções para se proteger do sol, como cobrir a cabeça com folhetos de propaganda. “Não adianta nada, mas a gente faz qualquer coisa para se proteger do calor”, disse ela, enquanto caminhava pelas ruas de Niterói, onde termômetros marcavam 45°C.
A pesquisadora Bruna Pavani, do Instituto Internacional para Sustentabilidade, aponta que medidas imediatas, como a instalação de fontes de água potável e áreas sombreadas, são essenciais para mitigar os efeitos do calor. No entanto, ela ressalta que é crucial combater as causas do problema. “Precisamos de ações de prevenção para que a temperatura não suba ainda mais”, afirma. A expansão urbana desordenada e a redução de áreas verdes e permeáveis agravam o problema, criando ilhas de calor que elevam as temperaturas nas cidades.
O pesquisador Luiz Marques, autor do livro O Decênio Decisivo, critica a falta de compromisso global com a redução das emissões de gases de efeito estufa. “Tivemos três grandes tratados internacionais sobre o meio ambiente e, de 1992 para cá, não houve progresso. Fracassamos completamente”, diz. Ele também aponta o agronegócio como um dos principais responsáveis pela destruição de biomas como a Mata Atlântica, essencial para regular o clima e evitar desastres como enchentes e secas.
Enquanto isso, em outras partes do mundo, milhões de pessoas já vivem os impactos da crise climática. Na Índia, Shakeela Bano e sua família dormem na laje de casa para escapar do calor insuportável dentro de seu quarto sem janelas. No Canadá, Patrick Michell, líder da Primeira Nação Kanaka Bar, viu sua cidade ser consumida por incêndios florestais após uma onda de calor que atingiu 53°C. “Não são mais incêndios florestais, são infernos”, desabafa.
A crise climática não é mais uma ameaça distante. Ela já está transformando vidas e ecossistemas, exigindo ações urgentes e coordenadas. Enquanto governos e corporações falham em cumprir acordos internacionais, a população busca soluções improvisadas para sobreviver ao calor extremo. A pergunta que fica é: até quando será possível adaptar-se a um planeta cada vez mais quente?