quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

Trabalho doméstico para além da cozinha

Nas conversas que temos no dia a dia, especialmente entre mulheres, um tema que quase sempre aparece é o trabalho doméstico. É um assunto tão comum que surge em meio à rotina de casa, no trabalho, na roda de amigos ou até numa festa. Isso acontece porque o trabalho doméstico está enraizado na estrutura da nossa sociedade. Mas, já parou pra pensar no que os homens conversam quando estão entre eles? Sobre o dever de casa dos filhos, provavelmente não é. E é por isso que a gente quer falar desse tema, mas de um jeito que mostre o que ele realmente é: uma forma de opressão contra as mulheres.

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Sim, a principal função do trabalho doméstico é oprimir. Mas o que é exatamente trabalho doméstico? À primeira vista, a gente nem percebe direito o contexto no qual estamos inseridos. Vivemos tão ocupados seguindo a vida que acabamos tratando certas coisas como naturais, sem parar pra refletir. Só que, na real, tudo faz parte de um esquema social e econômico muito maior, que molda nossas relações. Não somos tão donos do nosso destino quanto gostamos de acreditar, porque boa parte do que acontece com a gente depende de relações sociais regidas pelo dinheiro.

E nessa lógica, a opressão entra como um resultado direto desse sistema econômico. Vivemos rodeados pelo trabalho doméstico, mas nem sempre notamos sua dimensão. Quem realmente pensa em como a roupa ficou limpa? Ou em quem fez a comida chegar na mesa? Quem lavou a louça, manteve a casa em ordem, preparou comida para os bichinhos ou levou as crianças para a escola? E além disso, quase nunca se fala sobre como dar à luz e criar filhos também faz parte do trabalho doméstico. Tudo isso é o que a gente chama de “trabalho doméstico” ou “reprodução social”, que, na maioria das vezes, é feito por mulheres.

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E o pior? Essas mulheres acumulam esse trabalho com um emprego formal, gerenciando jornadas duplas, triplas, até mais. Exaustas, muitas acabam se esforçando para sustentar o rótulo de “guerreiras”, mesmo que isso custe sua saúde física e mental. Enquanto isso, muitos homens seguem com uma rotina mais leve: acordam, tomam café, vão trabalhar, voltam pra casa e encontram comida feita, cama limpa e, às vezes, até uma companheira que “se encaixa” no padrão de beleza.

Claro, existem homens que participam mais. Mas mesmo assim, a dependência do trabalho doméstico para o funcionamento da sociedade — e do capitalismo, especificamente — é enorme. Ainda assim, esse tema é invisibilizado. Não se discute isso abertamente, o que dificulta a criação de políticas públicas focadas no cuidado de mulheres, crianças, idosos e pessoas com deficiência. E se a gente parar pra pensar, sem o trabalho doméstico, o capitalismo não funciona. É simples: se não tiver alguém cuidando da casa e da família, quem vai estar pronto e “disponível” pra produzir riqueza?

Por isso, dá pra dizer que as mulheres não estão só gerando filhos. Elas estão gerando trabalhadores, que interessam ao sistema porque são eles que vão ajudar na acumulação de capital. E é exatamente por isso que a opressão via trabalho doméstico precisa acabar. Discussões sobre o tema já estão acontecendo, tanto no meio acadêmico quanto nos movimentos feministas, mas ainda há muito o que fazer.

O que a gente defende é uma abordagem mais ampla e crítica sobre o trabalho doméstico. É essencial que as mulheres entendam essa opressão, que busquem educação e se juntem a movimentos que as empoderem. Também precisamos de um Estado que tome a frente e implemente políticas públicas que ajudem a acabar com a romantização do trabalho doméstico gratuito.

Essa luta exigirá esforço coletivo. Trazer o trabalho doméstico para o centro das discussões nos movimentos sociais e na academia é uma ferramenta poderosa pra gerar mudanças. Isso precisa ser debatido como a causa urgente que é, porque não existe compatibilidade entre o trabalho remunerado e a imensa carga de cuidar da casa, pelo menos não quando a responsabilidade pesa, em grande parte, nos ombros das mulheres.

É preciso avançar. Não dá mais pra aceitar que tantas mulheres carreguem essa carga sozinhas e de graça, enquanto muitos homens se acomodam nessa dependência. A gente precisa começar a pensar em soluções práticas, como restaurantes e lavanderias comunitários, mas também trabalhar para uma verdadeira revolução feminista. Uma revolução que liberte as mulheres do peso do trabalho doméstico para que possam buscar seus próprios sonhos, carreiras e o direito de viver plenamente.

E no final, quando falamos sobre trabalho doméstico, não estamos falando de uma simples receita de bolo ou uma rotina qualquer. Estamos falando de algo muito maior: de conscientização, de troca de conhecimento, de crítica social e, principalmente, de luta. Uma luta que precisa ir além da cozinha e questionar o lugar que as mulheres ocupam na sociedade. Só assim é que vamos mudar esse cenário de opressão.

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Ludimila Nunes Mantovani
Ludimila Nunes Mantovani
Mulher, mãe de três filhos, sendo um deles autista, Assistente Social da UFES

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