Ao contrário da escrita, da pintura e da escultura, a música não possui suporte físico sobre o qual ela se desenvolve. Muitos estudiosos afirmam que o suporte da música é o tempo. Apesar disto, o tempo musical é bem diferente daquele com que lidamos cotidianamente.
A música é marcada por repetições e retornos que servem para dar coerência e facilitar a compreensão de uma obra. Na forma pela qual consumimos os lançamentos musicais, vemos outra forma de administrar esse tempo. Podemos adiantar e retornar com mais facilidade do que fazíamos na época dos discos e das fitas cassete.
Talvez isso explique em parte porque tantas músicas e artistas do passado voltam a fazer sucesso atualmente. Um caso bem interessante é Arthur Verocai, compositor carioca que participou de muitos festivais de música durante a década de 1960.
Em 1972, ele lançou seu primeiro álbum solo, Arthur Verocai. Apesar de suas qualidades como compositor e arranjador, o álbum não foi bem recebido pelo público e só foi redescoberto décadas depois por produtores de Hip Hop dos Estados Unidos que usaram as músicas de Arthur Verocai como base de seus samples. É o caso de Little Brother que sampleou Caboclo como base de We got now.
Outro dado interessante foi fornecido por meio de uma pesquisa realizada pela Roberts, a mais antiga fabricante de rádios do Reino Unido. De acordo com esse estudo realizado com jovens de até 23 anos, 57% das pessoas entrevistadas demonstraram interesse em ouvir mais músicas antigas, enquanto 36% afirmaram ter disposição em conhecer mais sobre essas músicas. Entre os entrevistados, apenas 18% diziam ter dificuldades para curtir canções mais velhas.
Esse interesse da geração Z associada às possibilidades de pesquisa na internet pode ser uma das possíveis explicações para esse interesse se transformar em admiração. Foi o que aconteceu com a música Dreams do Fleetwood Mac. Composta em 1977, a canção voltou a fazer sucesso como trilha musical de vídeos curtos que viralizaram na internet.
https://youtube.com/shorts/M5ZcCVUSWEo?si=X5phl6vxu5ruQjSN
Outra artista beneficiada pela rede mundial de computadores foi Kate Bush, que teve a sua música Running up the hills, de 1985, sendo alçada novamente às paradas de sucesso graças a sua inclusão na série Stranger things da Netflix. Depois da quarta temporada da série, Running up the hills foi reproduzida mais de 1 bilhão de vezes no Spotify.
Max’s Song (Full Scene) | Kate Bush – Running Up That Hill | Stranger Things | Netflix
Famosa por resgatar canções da década de 1980, Stranger things também apresentou versões diferentes de sucessos antigos. Foi o que aconteceu com Neverending story que fez de uma das cenas da terceira temporada da série fosse visualizada mais de 36 milhões de vezes no YouTube.
https://youtu.be/ehtsmxu1w10?si=A2C-QsGlxyd20wxr
Outro fator importante está ligado à influência e ao pioneirismo dos artistas do passado. Bruno Mars durante a sua infância chegou a se apresentar imitando Elvis Presley.
Bruno Mars age – 6 – elvis impersonator
O Rei do rock, no entanto, não foi o único a influenciar Bruno Mars. Michael Jackson também foi importante na trajetória do artista havaiano. Além dele, outros nomes de peso foram influenciados pelo rei do Pop. Dentre tantos podemos citar Justin Timberlake, The Weeknd, Rihanna, Drake, Ne-Yo, Kanye West, will.i.am, USHER, Jason Derulo.
Todos esses fatores contribuem para fazer com que os mais jovens se interessem por músicas das décadas de 1970, 1980 e 1990, reforçando a ideia de que na música o tempo não é tão linear quanto imaginamos. Como cantava Cazuza em O tempo não para:
Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não para.