domingo, 12 de janeiro de 2025

Como estamos envelhecendo?

Você já assistiu “A Substância”? O filme bombou na internet, virou fantasia de Halloween, teve memes espalhados pelas redes e colocou a atriz Demi Moore em evidência, mais uma vez. Procurei sinopses sobre o filme, e me deparei com a Amazon Prime que é um dos streamings de divulgação do longa em parceria com a Mubi, mas vamos à sinopse: “Você já sonhou com uma versão melhor de si mesmo? Você. Só que melhor em todos os sentidos. Você deveria experimentar este novo produto, A Substância. Ele mudou minha vida”.

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Para quem ainda não viu nada sobre o filme, o longa conta com uma dupla de protagonistas, Demi Moore e Margareth Qualley, que interpretam respectivamente Elisabeth Sparkle e Sue. Falou-se muito sobre a crítica à ditadura da beleza, sobre etarismo e como a indústria do entretenimento descarta quem – principalmente mulheres – atinge certa idade.

Coincidentemente na mesma semana que assisti o filme comecei um curso gratuito e online no Sesc Digital, com o tema “Como estamos envelhecendo?” e alguns dias depois reassisti o filme “A morte lhe cai bem”, um clássico com Meryl Streep, Goldie Hawn e Bruce Willis. 

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Ainda estou no processo de aprender sobre o envelhecimento, mas juntando esses 3 conteúdos, ressoa na minha mente a reflexão: não queremos envelhecer, queremos uma Substância, uma poção de vida eterna, mas porque envelhecer é tão ruim assim?

Parece simples, basta dizer “são construções sociais”. Só que no final todos envelhecemos e em algum momento morremos, o que faz “ser” velho tão ruim? Pode ser as dores, as doenças, perder o vigor talvez. E aqui eu ressalto um termo que aprendi no curso do Sesc Digital: Envelhecimento Ativo. Em um artigo da OMS – Organização Mundial de Saúde – diz “[…] os países podem custear o envelhecimento se os governos, as organizações internacionais e a sociedade civil implementarem políticas e programas de ‘envelhecimento ativo’ que melhorem a saúde, a participação e a segurança dos cidadãos mais velhos. A hora para planejar e agir é agora”. Mas o que isso tem haver com os filmes? 

O paralelo com o filme “A morte lhe cai bem” é mais óbvio, já que conta uma história sobre imortalidade, ou seja, o não querer morrer, ser eternamente jovem e belo. E em “A Substância” esse mesmo ser jovem e belo se repete, com contornos diferentes, mas o cerne do problema é o mesmo. Já no curso do Sesc, envelhecer é uma questão de saúde pública, como envelhecer bem e como criar políticas públicas que acolham a parcela da população que está envelhecendo. 

Este último mais importante, considerando os dados sobre violência contra idosos. O Ministério de Direitos Humanos e Cidadania divulgou uma matéria “Violências contra a pessoa idosa: saiba quais são as mais recorrentes e o que fazer nesses casos” com dados expressivos. Em casos de violência física contra pessoas idosas, no ano de 2023 foram registrados “[…] 129,5 mil violações físicas contra a pessoa idosa de janeiro a maio, um aumento de 106%, em relação ao ano passado, quando houve 62,7 mil registros no mesmo período. A maior parte das agressões físicas acontece dentro da própria casa da pessoa idosa, no seio de sua família, ocasionada por pessoas muito p´roximas como filhos, cônjuge, netos ou cuidadores domiciliares”. Além de outras formas de violência, como abuso financeiro, violência patromonial, violência sexual, discriminação, ressalto dados de mais duas, a primeira é abuso psicológico que “em 2023, foram registradas 120,3 mil violações psicológicas contra a pessoa idosa nos cinco primeiros meses do ano, um aumento de 40% em relação ao mesmo período do ano passado, que registrou 85,9 mil violações”, e a negligência, abandono e violência institucional, no mesmo ano foram registradas “[…] 37,4 mil violações de negligência contra a pessoa idosa. Já no que se refere ao abandono, foram 19,9 mil violações de janeiro a maio de [2023] e 2 mil no mesmo período do ano passado, um aumento de 855%”. 

Em uma sociedade moldada pelo modo de produção capitalista, somos condicionados a entender “vida boa” com “produtividade”, se você produz, você é alguém e para produzir o máximo do seu potencial é preciso ser jovem/adulto, pois o idoso já não teria o mesmo desempenho que um jovem. É esse “entendimento” fabricado e bombardeado na classe trabalhadora desde os primórdios da revolução industrial, que faz o envelhecer ser tão ruim. Como se viver bem dependesse exclusivamente de produzir/trabalhar para o patrão/burguês. E assim como a discussão em torno do fim da escala 6×1 vem de um movimento com o nome “Vida Além do Trabalho”, temos que diariamente lembrar que existe vida além do trabalho, que produzir pro patrão não é o objetivo das nossas vidas, ou que vivemos para trabalhar e quando esse trabalho acaba, nossa razão de viver também acaba.

É um exercício de reflexão difícil e profundamente criticado, ou você nunca se deparou com falas como: agradeça que você tem um trabalho; se tem muito trabalho, tem muito dinheiro; o trabalho dignifica o homem. Se socialmente somos julgados por simplesmente pensar que tem algo de errado no modo que vivemos, ou melhor no modo como o trabalho suga as nossas vidas para enriquecer quem já é rico, é preciso se organizar como classe trabalhadora, para criarmos juntos uma nova forma de ver, viver e envelhecer, sem o viés que descarta vidas, sem esse viés utilitarista que nos objetifica e torna as vidas como mais uma peça na grande máquina do capital. Não somos descartáveis, independente da idade, gênero, raça ou classe econômica. Valorizar a vida é para aqueles que ainda estão vivos, que estão à nossa volta, é acolher, cuidar e defender de injustiças. Todos envelhecem, acolher hoje, enquanto ainda há tempo, é ouvir, aprender com os idosos que fazem parte da nossa vida, estar presente, ser suporte no que for possível, é se humanizar! 

Para finalizar com uma indicação, vale a pena ouvir a música “Envelhecer” de Arnaldo Antunes, e comigo sempre levarei uma das frases da música: “A coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer”.

 

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Leticia Aguiar
Leticia Aguiar
Letícia Cristina é bibliotecária, empreendedora, costureira e amante dos cuidados capilares.

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